Eu
ignoro totalmente por que devemos fazer qualquer coisa aqui embaixo;
por que devemos ter amigos e aspirações, esperanças e sonhos. Não
seria mil vezes preferível retirar-se à distância do mundo, longe
de tudo o que provoca seu tumulto e suas complicações? Nós
renunciaríamos assim à cultura e às ambições, nós perderíamos
tudo sem obter nada em troca. Mas que podemos obter neste mundo? Para
algumas pessoas, nenhum ganho importa, porque eles são
irremediavelmente infelizes e solitários. Mesmo abertos a tudo
receber dos outros, ou a tudo ler nas profundezas de suas almas, em
que medida seríamos capazes de esclarecer seus destinos? Solitários
na vida, nós perguntamo-nos se a solidão da agonia não é o
próprio símbolo da existência humana. Lamentável fraqueza a de
querer viver e morrer em sociedade: existe alguma consolação
possível na última hora? É preferível morrer só e abandonado,
sem afetação e mentiras. Eu provo apenas desgosto por aqueles que,
na agonia, dominam-se e impõem-se atitudes para provocar uma
impressão. As lágrimas somente são quentes na solidão. Todos
aqueles que querem cercar-se de amigos na hora da morte, o fazem por
medo e incapacidade de afrontar o seu momento supremo. Eles procuram,
no momento essencial, esquecer sua própria morte. O quanto não se
armam de heroísmo, trancando a porta, para se submeter a estas
sensações temíveis com lucidez e terror sem limites?
Isolados,
separados, tudo nos é inacessível. A mais profunda das mortes, a
verdadeira morte, é a morte solitária, quando a própria luz
torna-se um princípio de morte. São tais momentos o que nos separam
da vida, do amor, dos sorrisos, dos amigos - e mesmo da morte.
Perguntamo-nos então, se existe outra coisa além do nada do mundo e
do nosso próprio nada.
Emil
Cioran, in Nos cumes do desespero
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