Lá atrás, Pedro Páramo, sentado em sua
cadeira de assento de couro, olhou o cortejo que ia até o povoado.
Sentiu que sua mão esquerda, ao querer se levantar, caía morta
sobre seus joelhos; mas não deu importância a isso. Estava
acostumado a ver morrer a cada dia algum de seus pedaços. Viu como o
jasmineiro se sacudia deixando cair suas folhas: “Todos escolhem o
mesmo caminho. Todos se vão.” Depois voltou ao lugar onde havia
deixado seus pensamentos.
— Susana — disse. Depois fechou os
olhos. — Eu pedi que você voltasse...
“...Havia uma lua grande no meio do
mundo. Eu perdia meus olhos olhando você. Os raios da lua
filtrando-se sobre a sua cara. Não me cansava de ver essa aparição
que era você. Suave, esfregada de lua; sua boca inchada e suave,
umedecida, colorida de estrelas; seu corpo transparentando-se na água
da noite. Susana, Susana San Juan.”
Quis levantar uma das mãos para clarear
a imagem; mas suas pernas a retiveram como se fosse de pedra. Quis
levantar a outra mão, que foi caindo devagar, de lado, até ficar
apoiada no chão como uma muleta detendo seu ombro murcho, desossado.
“Esta é a minha morte”, disse.
O sol foi virando-se sobre as coisas e
devolveu-lhes sua forma. A terra em ruínas estava na frente dele,
vazia. O calor caldeava seu corpo. Seus olhos mal se moviam; saltavam
de uma recordação a outra, desfazendo o presente. De repente seu
coração se detinha e parecia que também se detivessem o tempo e o
ar da vida.
“Desde que não seja uma nova noite”,
ele pensava.
Porque tinha medo das noites que enchiam
a escuridão de fantasmas. De encerrar-se com seus fantasmas. Disso
tinha medo.
“Sei que dentro de poucas horas virá
Abundio com suas mãos ensanguentadas me pedir a ajuda que eu neguei.
E eu não terei mãos para tapar os olhos e não vê-lo. Terei de
ouvi-lo; até que sua voz se apague com o dia, até que sua voz
morra.”
Sentiu mãos que tocavam seus ombros e
endireitou o corpo, endurecendo-o.
— Sou eu, dom Pedro — disse Damiana.
— Não quer que traga seu almoço?
Pedro Páramo respondeu:
— Vou até lá. Estou indo.
Apoiou-se nos braços de Damiana Cisneros
e fez a tentativa de caminhar. Depois de alguns tantos passos caiu,
suplicando por dentro; mas sem dizer uma única palavra. Deu uma
batida seca contra a terra e foi se desmoronando como se fosse um
montão de pedras.
Fim
Juan Rulfo, in Pedro Páramo
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