Essa
incapacidade de atingir, de entender, é que faz com que eu, por
instinto de... de quê? procure um modo de falar que me leve mais
depressa ao entendimento. Esse modo, esse estilo(!), já foi
chamado de várias coisas, mas não do que realmente e apenas é: uma
procura humilde. Nunca tive um só problema de expressão, meu
problema é muito mais grave: é o de concepção. Quando falo em
humildade, não me refiro à humildade no sentido cristão
(como ideal a poder ser alcançado ou não); refiro-me à humildade
que vem da plena consciência de se ser realmente incapaz. E
refiro-me à humildade como técnica. Virgem Maria, até eu mesma me
assustei com minha falta de pudor; mas é que não é. Humildade como
técnica é o seguinte: só se aproximando com humildade da coisa é
que ela não escapa totalmente. Descobri este tipo de humildade, o
que não deixa de ser uma forma engraçada de orgulho. Orgulho não é
pecado, pelo menos não grave: orgulho é coisa infantil em que se
cai como se cai em gulodice. Só que orgulho tem a enorme desvantagem
de ser um erro grave, com todo o atraso que erro dá à vida, faz
perder muito tempo.
Clarice
Lispector, in A
descoberta do mundo
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