Eu
queria usar palavras de ave para escrever.
Onde
a gente morava era um lugar imensamente e sem nomeação.
Ali
a gente brincava de brincar com palavras tipo assim:
Hoje
eu vi uma formiga ajoelhada na pedra!
A
Mãe que ouvira a brincadeira falou:
Já
vem você com suas visões!
Porque
formigas nem têm joelhos ajoelháveis
e
nem há pedras de sacristias por aqui.
Isso
é traquinagem da sua imaginação.
O
menino tinha no olhar um silêncio de chão
e
na sua voz uma candura de Fontes.
O
Pai achava que a gente queria desver o mundo
para
encontrar nas palavras novas coisas de ver assim:
eu
via a manhã pousada sobre as margens do rio
do
mesmo modo que uma garça aberta na solidão de uma pedra.
Eram
novidades que os meninos criavam com as suas palavras.
Assim
Bernardo emendou nova criação:
Eu
hoje vi um sapo com olhar de árvore.
Então
era preciso desver o mundo
para
sair daquele lugar imensamente e sem lado.
A
gente queria encontrar imagens de aves abençoadas pela inocência.
O
que a gente aprendia naquele lugar era só ignorâncias
para
a gente bem entender a voz das águas e dos caracóis.
A
gente gostava das palavras quando elas perturbavam
o
sentido normal das ideias.
Porque
a gente também sabia que só os absurdos
enriquecem
a poesia.
Manoel
de Barros
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