Não
chovia, meses a fio. Ou chovia demais. As plantas secavam, os animais
morriam, os moradores emigravam. As plantas submergiam, os animais
morriam, as pessoas não tinham tempo de emigrar. Assim era a vida
naquele lugar privilegiado, onde medrava tudo para todos, havendo bom
tempo. Mas não havia bom tempo. Havia o exagero dos elementos.
O
mágico chegou para reorganizar a vida, e mandou que as chuvas
cessassem. Cessaram. Ordenou que a seca findasse. Findou. Sobreveio
um tempo temperado, ameno, bom para tudo, e os moradores estranharam.
Assim também não é possível, diziam. Podemos fazer tantas coisas
boas ao mesmo tempo que não há tempo para fazê-las. Antes, quando
estiava ou chovia um pouco — isto é, no intervalo das grandes
enchentes ou das grandes secas —, a gente aproveitava para fazer
alguma coisa. Se o sol abrasava, podíamos fugir. Se a água vinha em
catadupa, os que escapavam tinham o que contar. Quem voltasse do
êxodo vinha de alma nova. Quem sobrevivesse à enchente era
proclamado herói. Mas agora, tudo normal, como aproveitar tantas
condições estupendas, se não temos capacidade para isto?
Queriam
linchar o mágico, mas ele fugiu a toda.
Carlos
Drummond de Andrade, in Contos Plausíveis
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