PARA:
MACHADO DE ASSIS
ASSUNTO:
MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS E DOM CASMURRO
Prezado
postulante,
Talvez
o senhor não esteja sendo bem orientado (seu agente literário tem
péssima reputação na praça – quem avisa amigo é…), mas via
de regra os candidatos a um lugar ao sol no inclemente mercado
editorial deveriam enviar apenas um, e olhe lá, original por vez.
O
romance delirante que o senhor classificou como “memórias
póstumas” definitivamente não nos interessa. Como assim, um autor
defunto? É do conhecimento de todos que não somos uma editora de
filiação kardecista. Podemos, no entanto, encaminhar sua obra aos
responsáveis pelo nosso selo de religião, autoajuda e assuntos
espirituais. Avise-nos, caso seja de seu interesse (por e-mail, por
favor, pois não dispomos de infraestrutura para receber uma
comunicação mediúnica, do tipo mesa branca).
Quanto
ao outro original, aquela história de um casamento malsucedido, Dom
Casmurro,
detectamos um problema na trama: afinal, Capitu traiu ou não o
marido? Isso não fica claro. Talvez fosse preciso reescrever o texto
adotando outro ponto de vista que não o de Bentinho, parte
interessada em nos fazer crer ter sido ele vítima de adultério. E
se a narradora fosse a prima Justina, que “dizia francamente a
Pedro o mal que pensava de Paulo, e a Paulo o que pensava de Pedro”?
Parece-nos uma voz mais isenta, capaz de narrar os acontecimentos com
a distância que o enredo exige.
Last
but not least,
para usar uma expressão do agrado dos autores anglo-saxônicos que o
senhor frequenta, gostaríamos de reconhecer sua coragem e
perseverança em nos ter submetido outros exercícios literários de
sua lavra, não obstante havermos recusado Casa
Velha.
Magoounos, porém, seu agente (ele, de novo…) ter vazado para a
imprensa a notícia da recusa (cf. Folha
de S.Paulo
de 21.04.1999). Isso não se faz.
Por
ora, são esses os nossos comentários.
Maria
Emilia Bender, in revista Piauí
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