Fotograma do filme Policarpo Quaresma, herói do Brasil
Policarpo
Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário público, certo de que a
língua portuguesa é emprestada ao Brasil; certo também de que, por
esse fato, o falar e o escrever em geral, sobretudo no campo das
letras, se veem na humilhante contingência de sofrer continuamente
censuras ásperas dos proprietários da língua; sabendo, além, que
dentro do nosso país, os autores e os escritores, com especialidade
os gramáticos, não se entendem no tocante à correção gramatical,
vendo-se, diariamente, surgir azedas polêmicas entre os mais
profundos estudiosos do nosso idioma - usando do direito que lhe
confere a Constituição, vem pedir que o Congresso Nacional decrete
o Tupi-Guarani como língua oficial e nacional do povo brasileiro.
O
suplicante, deixando de parte os argumentos históricos que militam
em favor de sua ideia, pede vênia para lembrar que a língua é a
mais alta manifestação da inteligência de um povo, é a sua
criação mais viva e original; e, portanto, a emancipação política
do País requer como complemento e consequência a sua emancipação
idiomática.
Demais,
Senhores Congressistas, o Tupi Guarani, língua originalíssima,
aglutinante, é verdade, mas a que o polissintetismo dá múltiplas
feições de riqueza, é a única capaz de traduzir as nossas
belezas, de pôr-nos em relação com a nossa natureza e adaptar-se
perfeitamente aos nossos órgãos vocais e cerebrais, por ser criação
de povos que aqui viveram e ainda vivem, portanto possuidores da
organização fisiológica e psicológica para que tendemos,
evitando-se dessa forma as estéreis controvérsias gramaticais,
oriundas de uma difícil adaptação de uma língua de outra região
à nossa organização cerebral e ao nosso aparelho vocal -
controvérsias que tanto empecem o progresso da nossa cultura
literária, científica e filosófica.
Seguro
de que a sabedoria dos legisladores saberá encontrar meios para
realizar semelhante medida e cônscio de que a Câmara e o Senado
pesarão o seu alcance e utilidade.
P.
e E. Deferimento.
Lima
Barreto, In
Triste
Fim de Policarpo Quaresma
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