“Sou,
simplesmente, uma pessoa com algumas ideias que lhe têm servido de razoável
governo em todas as circunstâncias, boas ou más, da vida. Costuma-se dizer que
o melhor partido para um crente é comportar-se como se Deus estivesse sempre a
olhar para ele, situação, imagino eu, que nenhum ser humano terá estofo para
aguentar, ou então é porque já estará muito perto de tornar-se, ele próprio,
Deus. De todo o modo, e aproveitando o símile, o que eu tenho feito é imaginar
que essas tais ideias minhas, estando dentro de mim como devem, também estão
fora — e me observam. E realmente não sei o que será mais duro: se prestar
contas a Deus, por intermédio dos seus representantes, ou às ideias, que os não
têm. Segundo consta, Deus perdoa tudo — o que é uma excelente perspectiva para
os que nele acreditem. As ideias, essas, não perdoam. Ou vivemos nós com elas,
ou elas viverão contra nós — se não as respeitamos.”
José Saramago, in Cadernos de Lanzarote (1995)
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