Objetos
quebrados durante a performance "O Globo da Morte de Tudo", de Nuno
Ramos e Eduardo Climachauska - foto: Leonardo Wen/Folhapress
Em
55 segundos, o caos tomou conta da galeria. Motociclistas rodaram a toda
velocidade dentro de dois globos da morte presos a estantes cheias de objetos
frágeis, de copos de cerveja a vidros de nanquim e tubos de talco.
Do lado de fora,
Nuno Ramos e Eduardo Climachauska, autores da performance que aconteceu no mês
passado na galeria Anita Schwartz, no Rio, dirigiam a equipe de filmagem que
penou para registrar cada ângulo do terremoto artificial -uma ação que destruiu
em menos de um minuto um trabalho que consumiu meses.
"Foi um
Pollock, adorei", disse Ramos, comparando a ação que fez tremer o espaço
da Gávea à técnica de pintura do expressionista abstrato norte-americano, que
pingava tinta sobre suas telas em gestos bruscos das mãos.
Mas,
ao contrário de Pollock, que no final da ação tinha um quadro para vender, o
trabalho de Ramos e Climachauska virou ruína. Esse tipo de ação, que investe
pesado em obras efêmeras e invendáveis, marcou o cenário das galerias do país
no ano que acabou anteontem.
"Tem
gente dizendo que eu sou maluca", diz a galerista Anita Schwartz, que investiu R$
300 mil na performance. "Mas essas ações revelam outro lado do artista.
Não é só aquilo que ele vende, mas também aquilo que pensa."
Antes da ação no
Rio, Ramos enterrou réplicas em tamanho real das casas onde viveu em enormes
poças de lama e barro escavadas no chão de concreto da galeria Celma
Albuquerque, em Belo Horizonte, interditando o espaço por meses numa obra que
removeu 300 toneladas de entulho da galeria e custou cerca de R$ 400 mil.
"É um
projeto que não dá para repetir todo ano, mas a gente encarou porque tem horas
que você precisa dar um passo adiante", diz Flávia Albuquerque, diretora
da galeria mineira. "Nunca fizemos algo tão dramático."
Em São Paulo,
galerias mantiveram esse drama. A Fortes Vilaça ocupou todo o espaço de seu
galpão na Barra Funda com uma mega-instalação de Sara Ramo, uma espécie de
labirinto de paredes brancas gigantescas.
A Millan deixou
Henrique Oliveira transformar seu espaço na Vila Madalena com enormes
saliências e reentrân-cias no chão, nas paredes e no teto, como se o prédio
derretesse diante do público.
Essa mesma
galeria também quebrou o piso do estacionamento para afundar um carro numa
cratera de cimento molhado, uma instalação da artista Tatiana Blass.
"São
exposições que têm um custo alto", diz Socorro de Andrade Lima, sócia da
Millan. "Mas não é uma equação simples e direta. O retorno disso é mostrar
que a galeria acredita no trabalho daquele artista. Uma obra sólida só consegue
mostrar sua solidez nessas ocasiões."
Sólidas ou não,
ações desse tipo se tornaram cada vez mais necessárias para garantir a liquidez
de galerias num cenário que se tornou mais competitivo, com a abertura de novas
casas que disputam o passe dos nomes de peso.
"Com o boom
da arte brasileira, as galerias têm novas demandas, seus espaços precisam ser
mais institucionais", diz Ivo Mesquita, diretor da Pinacoteca do Estado.
"Galerias estão mais ambiciosas, e o fato de investirem nessas obras
complementa o trabalho dos museus."
Mas as casas
comerciais, dispostas a despejar dinheiro em ações que aumentam a visibilidade
de seus artistas, também acabam expondo a fragilidade dos museus no país, que
não conseguem bancar ações tão faraônicas.
"No circuito brasileiro, as galerias
estão mais desenvolvidas do que os museus", afirma Marcia Fortes, sócia da
Fortes Vilaça, acrescentando que mostras institucionais em galerias não são uma
tendência atual. "Isso também faz parte do nosso objetivo e escopo. É
representar um artista por inteiro, e não por meros interesses
comerciais."
Fonte: www1.folha.uol.com.br, por Silas Martí
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