Sêneca
| VI
1.
Devemos, no entanto, primeiro examinar-nos a nós mesmos, depois o
negócio que nos propomos a realizar, depois aqueles para os quais ou
em cuja sociedade o realizamos.
2.
É, sobretudo, necessário formar uma verdadeira estimativa de si
mesmo, porque, em regra, achamos que podemos fazer mais do que somos
capazes: um homem é levado longe demais pela confiança em sua
eloquência, outro exige mais de seu patrimônio do que ele pode
produzir, outro sobrecarrega um corpo fraco com algum trabalho
pesado. Alguns homens são demasiado envergonhados para a condução
dos negócios públicos, que exigem uma atitude de descontração: o
orgulho obstinado de alguns torna-os impróprios para os tribunais:
alguns não conseguem controlar sua raiva, e rompem em linguagem
descontrolada com a mais leve provocação: alguns não conseguem
conter sua espirituosidade ou resistir a fazer piadas arriscadas:
para todos esses homens o ócio é melhor que o trabalho: uma
natureza ousada, altiva e impaciente deve evitar tudo o que possa
levá-la a usar de uma liberdade de expressão que a arruinará.
3.
Em seguida, devemos fazer uma estimativa do assunto que queremos
tratar, e comparar nossas forças com a façanha que estamos prestes
a empreender: pois o portador deve ser sempre mais poderoso do que
sua carga: de fato, cargas que são pesadas demais para o portador
necessariamente o devem esmagar.
4.
Alguns assuntos também não são tão importantes em si mesmos, pois
são prolíficos e conduzem a muito mais trabalho, o qual, por
envolver-nos em novas e variadas formas de atuação, convém que
sejam recusados. Também não se deve engajar em nada de que não
seja livre para recuar: apegue-se a algo que possa terminar, ou, pelo
menos, que acredite poder terminar: é melhor não se intrometer
naquelas operações que crescem em importância, enquanto estão
sendo transacionadas, e que não vão parar onde você pretendia que
fossem interrompidas.
Sêneca, em Sobre a Tranquilidade da Alma
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