Epígrafe
“Irreplegível
— Este vocábulo se encontra em Bernardes, Nova Floresta,
IV, 348, como tradução dum lat. irreplegibile, usado por Tomás
Morus numa contenda com um pretensioso na corte de Carlos V, conforme
conta o padre Jeremias Drexelio no seu Faetonte. Parece tratar-se de
uma palavra hipotética, adrede inventada por Morus para pôr em
apuros o contendor. Maximiano Lemos, Enciclopédia Portuguesa,
Ilustrada, e Cândido de Figueiredo filiam ao lat. in e
replere, encher, e dão ao vocábulo o sentido de insaciável,
cuja impossibilidade Horácio Scrosoppi provou em suas Cartas
Anepígrafas, págs. 73-80.”
Antenor
Nascentes. Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa.
§
1
Evidentemente
os glossemas imprizido, sengraçante e antipodático
não têm nem merecem ter sentido; são vacas mansas, aqui vindo só
de propósito para não valer.
§
2
À
neologia, emprego de palavras novas, chamava Cícero “verborum
insolentia”. Originariamente, insolentia designaria
apenas: singularidade, coisa ou atitude desacostumada, insólita;
mas, como a novidade sempre agride, daí sua evolução semântica,
para: arrogância, atrevimento, atitude desaforada, petulância
grosseira.
§
3
Também
ocorre a neologia nos psicopatas, nos delirantes crônicos
principalmente. Dois exemplos recordo, de meus tempos médicos:
— “Estou
estramonizada!” — queixava-se uma doente, de lhe aplicarem
medicação excessiva.
— “Enxergo
umas pirilâmpsias...” — dizia outro, de suas alucinações
visuais.
§
4
“A
maior glória desse (Félicien de) Champsaur, ficcionista que se
extinguiu com pouco barulho, consiste, se não nos enganamos, em
haver criado o vocábulo ‘arriviste’, que nós outros
transportamos ao português ‘arrivista’, não sem escândalo das
vestais do idioma.”
Agrippino
Grieco. Amigos e Inimigos do Brasil.
§
5
Houve
também um tempo do galicismo. Dele é que nos vêm os termos
“galicista”, “galicíparla”, “galiparla” e
“galiparlista”... Nessa era, jacto (jato) significava apenas
“arremesso, impulso, saída impetuosa de um líquido”. Alguém
fez “ludopédio” contra o anglicismo futebol e o Dr.
Estácio de Lima propôs um “anhydropodotheca” para substituir
galocha.
§
7
Por
falar: duas esplêndidas criações da gíria popular merecem,
s.m.j., imediata dicionarização e incorporação à linguagem
culta: gamado (gamar, gamação etc.) e aloprado.
§
8
Edmundo
Barbosa da Silva. Embaixador, sertanejo, oxoniano e curvelano, da
beira do Bicudo; e gentleman farmer, gentilhomme campagnard,
gentil-homem principalmente. Dono da Fazenda-da-Pedra, entre São
Fidélis e Campos.
§
9
Informação
do Dr. Camilo Ermelindo da Silva, que, aliás, quando passávamos por
Dourados, vindo da fronteira com o Paraguai, deu-nos um dos almoços
mais lautos e lúcidos de nossa lembrança.
Pós-escrito:
Confira-se
o de Quintiliano, sobre as palavras:
“Usitatis
tutius utimur, nova non sine quodam periculo fingimus. Nam si recepta
sunt, modicum laudem adferunt orationi, repudiata etiam in iocos
exeunt. Audendum tamen; namque, ut Cicero ait, etiam quae primo dura
visa sunt, usu molliuntur.”
(“O
mais seguro é usar as usadas, não sem um certo perigo cunham-se
novas. Porque, aceitas, pouco louvor ao estilo acrescentam, e,
rejeitadas, dão em farsa. Ousemos, contudo; pois, como Cícero diz,
mesmo aquelas que a princípio parecem duras, vão com o uso
amolecendo.”)
Guimarães Rosa, em Tutameia

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