O
verdugo
Enrolado
em cordas e correntes, vem Carvajal dentro de uma cesta enorme que as
mulas arrastam. Entre redemoinhos de pó e gritos de ódio, o
guerreiro canta. Sua bronca voz atravessa o clamor dos insultos,
alheia às patadas e aos golpes de quem ontem o aplaudia e hoje
cospe-lhe na cara:
Que
ventura!
Criança
no berço
velho
no berço!
Que
ventura!
canta
na cesta que o leva aos trambolhões. Quando as mulas chegam ao
patíbulo, lá em cima, os soldados atiram Carvajal aos pés do
verdugo. Brame a multidão enquanto o verdugo desembainha, lento, o
alfanje.
– Irmão
Juan – pede Carvajal. – Já que somos do ofício, trate-me de
alfaiate a alfaiate.
Juan
Enríquez é o nome deste rapaz de rosto doce. Outro nome tinha em
Sevilha, quando passeava pelo cais sonhando com ser verdugo do rei na
América. Se comenta que ama o ofício porque mete medo e não há
senhor principal nem grande guerreiro que não se afaste de seus
passos pelas ruas. Também se diz que é um vingador afortunado.
Pagam a ele para que ele mate; e não se enferruja sua arma, nem se
apaga seu sorriso.
Ai
avô!
Ai
avô!,
cantarola
Carvajal, em voz baixa e triste, porque bem agora deu para pensar em
seu cavalo, Boscanillo, que também está velho e derrotado, e pensar
em como se entendiam bem.
Juan
Enríquez empunha a barba com a mão esquerda e com a direita
corta-lhe o pescoço de um talho.
Debaixo
do sol, explode uma ovação.
O
verdugo exibe a cabeça de Carvajal, que até um instante atrás
tinha oitenta e quatro anos e jamais tinha perdoado ninguém.
Eduardo Galeano, em Os Nascimentos
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