Muita
gente, pelo fato de minha vida ser escrever, me pergunta como
escrevo. E pelo rosto expressivo dessas pessoas adivinho que
secretamente estão escrevendo alguma coisa, e com dificuldade. Eu
não posso dar lição sobre escrever pois em mim o processo e
a elaboração se fazem inconscientemente até que tudo amadureça e
venha à tona.
Nem
sei bem como se escreve. Escrever é saber respirar dentro da frase.
É pôr algum silêncio tanto nas linhas como nas entrelinhas para
que o leitor possa respirar comigo, sem pressa, adaptando-se não só
ao seu ritmo como ao meu, numa espécie de contraponto indispensável.
Para
se chegar pelo menos a esse ponto, o de respirar dentro da frase,
adestrei-me desde os sete anos de idade. Sem ter planejado nada
antes, aos quinze anos comecei a ser uma profissional paga pelo que
escreve.
Não
estou dizendo que a preparação tem que ser tão longa: em algumas
pessoas talvez as elaborações se façam mais depressa. Minha
preparação consistiu em aprender a respirar, em não trair eu mesma
o meu modo de escrever que alguns chamam de estilo e eu chamo de:
estilo natural. Por isso fico muito grata ao meu revisor que nunca me
alterou em nada, nem em palavras, nem em pontuação. Meu revisor se
limita em pôr os acentos, pois vivo esquecendo. Um rapaz de Brasília
veio ao Rio, e entre as coisas que anotou para fazer, era a de me
visitar e, segundo entendi pelo telefone, queria me ver para eu lhe
dizer se se pode viver como escritor. No dia em que ele marcou comigo
para vir, depois do almoço num domingo, eu infelizmente adormeci, e
o rapaz foi embora. Desculpe. Um dia me procure de novo. Mas desde já
posso lhe dizer que é praticamente impossível, no Brasil, viver com
o que se ganha por livro. O remédio é ser jornalista e ter mais
outro empreguinho: acumulando empreguinhos você junta o dinheiro
necessário para ter uma vida apenas razoável, financeiramente
falando. No meio desse trabalho todo, tem que achar tempo para
pesquisar um pouco na sua literatura.
Clarice Lispector, em Todas as crônicas
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