Inês
Suárez
Há
poucos meses, Pedro de Valdívia descobriu este monte e este vale. Os
araucanos, que tinham feito a mesma descoberta alguns milhares de
anos antes, chamavam o monte de Huelén, que significa dor. Valdívia
batizou-o de Santa Luzia.
Da
crista do morro, Valdívia viu a terra verde entre os braços do rio
e decidiu que não existia no mundo melhor lugar para oferecer uma
cidade ao apóstolo Santiago, que acompanha os conquistadores e luta
por eles.
Cortou
os ares sua espada, nos quatro rumos da rosa dos ventos, e assim
nasceu Santiago do Novo Extremo. Assim cumpre, agora, seu primeiro
verão: umas poucas casas de barro e madeira, com telhado de palha, a
praça ao centro, a paliçada ao redor.
Apenas
cinquenta homens ficaram em Santiago. Valdívia anda com os outros
pelas ribeiras do rio Cachapoal.
Ao
despontar do dia, a sentinela dá o grito de alarma do alto da
paliçada. Pelos quatro cantos aparecem os esquadrões indígenas.
Os
espanhóis escutam os alaridos de guerra e em seguida cai em cima
deles um vendaval de flechas.
Ao
meio-dia, algumas casas são pura cinza e a paliçada caiu. Luta-se
na praça, corpo a corpo.
Inês
corre então até a choça onde funciona a prisão. O guardião
vigia, ali, os sete chefes araucanos que os espanhóis tinham
prendido tempos atrás. Ela sugere, suplica, ordena que lhes cortem
as cabeças.
– Como?
– As
cabeças!
– Como?
– Assim!
Inês
agarra uma espada e as sete cabeças voam pelos ares.
A
batalha muda de direção. As cabeças convertem os sitiados em
perseguidores. Na acometida, os espanhóis não invocam o apóstolo
Santiago, mas Nossa Senhora do Socorro.
Inês
Suárez, a malaguenha, tinha sido a primeira a acudir quando Valdívia
alçou a bandeira de alistamento em sua casa em Cuzco. Veio a estas
terras do sul à cabeça das hostes invasoras, cavalgando ao lado de
Valdívia, espada de aço bom e cota de fina malha, e desde então
junto a Valdívia macha, luta e dorme. Hoje, ocupou seu lugar.
É
a única mulher entre os homens. Eles dizem: “É um macho”, e a
comparam com Roldão e com El Cid, enquanto ela esfrega azeite sobre
os dedos do capitão Francisco de Aguirre, que ficaram presos no
punho da espada e não existe maneira de abri-los, embora a guerra,
por enquanto, tenha terminado.
Eduardo Galeano, em Os Nascimentos
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