segunda-feira, 3 de junho de 2024

Parte IV | 6.

Leoazinha nutria profunda aversão pelo ranário e não tinha nenhuma simpatia por Yuan Bochecha e meu primo. No entanto, pouco depois da nossa visita à maternidade sino-americana, ela disse de repente: “Corre Corre, vou trabalhar no ranário!”.
Olhei surpreso para seu rosto enorme e radiante.
É sério, não estou de brincadeira”, desmanchou o sorriso e assumiu um ar sisudo.
Aqueles bichos”, me esforcei para repelir a imagem das rãs que teimava em aparecer na minha cabeça, “quase peguei fobia de batráquios depois de ver o programa sobre minha tia — você vai criar aqueles bichos?”
Na verdade, não há por que ter medo de anfíbios, eles têm o mesmo ancestral do homem”, ela disse. “O girino tem a mesma forma do espermatozoide e o óvulo humano também não difere muito de um ovo de rã. Além disso, já viu um feto com menos de três meses? Tem uma cauda comprida, igualzinho aos anfíbios na fase da metamorfose.”
Olhei para ela ainda mais espantado.
Ela parecia recitar de cor: “Por que a palavra ‘wa’ pode significar tanto ‘rã’ como ‘bebê’? Por que o choro de um bebê que saiu do ventre da mãe é parecido com o coaxo de uma rã? Por que os bonecos de barro da nossa terra muitas vezes têm uma rã no colo? E por que a deusa criadora da humanidade se chama Nü Wa? Tudo isso indica que o ancestral dos seres humanos foi uma grande rã, o homem evoluiu da rã. É totalmente errada a teoria de que o homem veio do macaco…”.
Pouco a pouco fui percebendo em sua fala o estilo de Yuan Bochecha e do meu primo, e assim me dei conta de que ela tinha caído na lábia daqueles dois.
Pois muito bem”, eu disse, “se você estiver realmente entediada de ficar em casa, claro que pode ir lá para se distrair um pouco, mas”, continuei com um sorriso, “acho que em uma semana, no máximo, você vai sair de lá sem querer olhar para trás.”

Mo Yan, in As rãs

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