Pedem-me
que indique
– uma
–
a
mais bela
palavrada
língua portuguesa.
Começo
como o enólogo
ou
filólogo
a
saboreá-las
nos
cantos vários da boca.
CRISTAL
palavra
sonora
iridescente
eco
irradiante
e musical.
AROMA
termo
que ressuma
e
assoma
e
levemente perfuma.
CARÍCIA
tem
cicio
de
lábios e dedos
dedilhando
delícias.
LIBÉLULA
é
leve pluma
pronunciá-la
é despertar-lhe as asas
uma
a uma.
Cada
palavra reverbera
tonalidades
íntimas.
E
há aquelas que são redondas
como
LÓBULO e GLÚTEOS
e
vão ROLANDO como ONDAS.
E
há outras tortas
quebradas
que
saem aos cacos
como
CACTOS e PACTO.
E
há as finas
que
entre as grades das sílabas
como
o vento
passam
SIBILINAS
as
que vão COLEANTES
como
SERPENTES SERPENTINAS
e
as que peludas deslizam
como
SUSSUARANA.
Há
as pegajosas como LESMA e GOSMA
e
as AMORFAS MOLES
como
ROCAMBOLE.
Há
as como TRICLÍNIO
que
dão vontade de desdobrar
ou
repousar
e
outras como RUFLAR
– barulho
de penas no ar.
Há
palavras macias e FOFAS
como
PAINAS
e
aquelas que parecendo algodão
são
o contrário do que dizem
como
FAINA.
Outras
são duras, concretas
têm
arestas como a alma
de
certos não poetas.
Há
as LÂNGUIDAS que a gente fala
e
vê se desmanchando
e
há as PERIPATÉTICAS
andando
nos PARALELEPÍPEDOS
urbanos
de forma geométrica.
Numa
língua são belas
noutras
impuras. Numa boca
são
verdade, noutras
perjuras.
Há
as fabricadas
em
agências de propaganda
e
as que renascem
na
boca dos amantes
muitas
são banais
conhecidas
quase
sem cor e vida
mas
de repente revelam
a
sua secreta face
e
fazem do usuário mais simples
um
escritor ou poeta.
Affonso Romano de Sant’Anna, em A implosão da mentira e outros poemas [Ilustrações de Camila Mesquita]
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