... são um evento assombroso. Começa com aquela festa linda, comovente, festa de fraternidade e paz. Norte-americanos e iraquianos desfilaram no mesmo desfile sem que o Bush tentasse matar os atletas do Iraque como terroristas disfarçados. Ele estava jogando golfe. O grande símbolo: uma oliveira cheia de folhas! Dizem os poemas sagrados que a pomba que Noé soltou ao final do dilúvio voltou com um ramo de oliveira no bico. Que bom seria se aquela oliveira anunciasse o fim do dilúvio de loucuras bélicas que está destruindo o mundo! Algumas dessas festas ficam inesquecíveis. Lembro-me do ursinho que marcou as Olimpíadas de Moscou. No encerramento, o ursinho chorou: lágrimas escorriam pelo seu rosto. Sei muito bem que urso não tem rosto, urso tem é focinho, mas seria feio dizer “lágrimas escorriam pelo seu focinho”. Do jeito como as coisas vão, em breve se dirá que os bichos têm rosto e os homens têm focinho. Aí chega o primeiro dia. Vai-se a fraternidade. Agora é briga. Briga pelo pódio. O pódio é motivo de briga. Todo pódio é motivo de briga. Nas Olimpíadas não há lugar para fraternidade porque fraternidade significa todo mundo junto brincando de roda e nas Olimpíadas não há cantigas de roda. No pódio só cabem três. Cada atleta quer mesmo é que o outro se dane. Ah! A suprema felicidade do velocista dos 100 metros quando sabe que o recordista baixou no hospital acometido de uma súbita cólica renal, na véspera das finais. E as ginastas rezam, enquanto as adversárias executam os seus números: “Tomara que ela escorregue...”.
Rubem Alves, in Ostra feliz não faz pérola
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