Nunca
fui muito fã de contos de fadas nem de histórias de princesas. Meus
desenhos favoritos – tão pouco previsíveis – eram os do Mogli e
do Tintim. Aos 15, comecei a implicar com as comédias românticas,
dizendo que eram todas histórias impossíveis, que nunca
aconteceriam na minha vida. Sempre acreditei no amor, mas não nas
histórias de cinema. Filha de virginiana germânica, aprendi a
acreditar no pé no chão e no afeto. Mas parece que a vida quis me
reservar algo diferente.
São
Paulo, junho de 2013: foi quando ele me viu pela primeira vez. Viajou
8.000km para estar naquele casamento, mas eu nem o vi. Seis meses
depois, fomos apresentados em Lisboa. Eu disse “Muito prazer” e
ele respondeu “Tu não te lembras de mim, mas eu não esqueci de
ti”. Frio na barriga. Conversamos a noite toda. Não contava com a
ideia de me interessar por um homem separado, pai de uma filha de 3
anos. Os olhos dele brilhavam ao falar da menina e os meus brilhavam
ao olhar para os dele. Mas soaram as 12 badaladas e eu tive que ir
embora. Nunca gostei da Cinderela.
Segui
para Coimbra com um nó na garganta, sabendo que havia deixado pontas
soltas naquela história. Quando ele decidiu ir atrás de mim, eu já
estava a caminho de Paris. Algumas horas depois, ele bateu na porta
do meu quarto de hotel no Boulevard du Montparnasse, como nas
melhores histórias de cinema. Nos despedimos com duas garrafas de
vinho na cabeça e alguma angústia. Ele voltou para Portugal, eu
voltei para o Brasil.
Achei
que o romance acabava ali. Já era uma boa história para contar. Mas
pouco tempo depois ele apareceu em São Paulo. Tive a esperança de
conseguir parar o tempo naqueles dias. Ele embarcou de volta e eu
tentei engolir o choro. Não consegui nem parar o tempo, nem engolir
o choro. Tempos depois, decidi estudar em Roma. Arranjei uma escala
em Lisboa. Desembarquei, abracei-o e disse que não queria me
despedir dele. Ele disse que eu não precisaria me despedir e
embarcou para Roma comigo. Dias depois, ele teve que ir à França e
eu à República Tcheca. Realmente, aquela não era uma história
fácil. Depois disso, houve mais do que saudade. Houve medo. Tentamos
desistir de tudo, mas logo percebemos que já não havia volta.
Nos
encontramos, então, no meio do oceano. Ilha de São Miguel dos
Açores, Lagoa das Sete Cidades. A partir dali, eu decidi que não
podia mais fugir. Meses depois, desembarquei em Lisboa com duas malas
grandes e bastante medo. Começamos a namorar em Milão. Me apaixonei
pela filha dele e ela por mim. Tempos depois tive que voltar para o
Brasil. A vida e o trabalho não perdoam. Nos despedimos com lágrimas
em Madri, sem saber o que esperar. Ele foi me ver em São Paulo de
novo. Foi embora e eu fiz as malas outra vez. Decidimos viver juntos.
Brigamos na Ilha da Madeira. Resolvemos. Brigamos em Londres.
Resolvemos. Percebemos que nem as diferenças nem as distâncias eram
mais fortes do que a vontade de estarmos juntos.
Agora,
depois de mais de três anos no meio desse furacão geográfico, dei
a ele de presente uma máquina de fazer espaguete. Talvez eu não
seja muito boa com presentes. Mas ele tirou do bolso uma caixinha
preta de veludo. Abriu-a, reluzente, e disse que se percorremos
tantas distâncias e se fomos tão pacientes e tão resistentes,
tinha certeza de que era a coisa certa a fazer.
Sim,
é claro que eu quero, portuga. Na alegria e na tristeza, na saúde e
na doença, nas chegadas e nas partidas, no hemisfério sul e no
hemisfério norte. Impossível seria não querer. Impossível seria
não me apaixonar por você nem pela nossa história. Que venham
muitos anos, muitas malas pesadas e muitos cartões de embarque.
Obrigada por nunca termos desistido.
Ruth Manus, in Um dia ainda vamos rir de tudo isso
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