terça-feira, 3 de outubro de 2023

Três encontros que são quatro

Foi triste o encontro. Não via esta pessoa há muito tempo mesmo. Fiquei surpreendida: a alma desta pessoa tinha murchado e pendia solta sem sequer aflição. Tentei como pude insuflar-lhe vida como se insufla vida num afogado. Mas a pessoa não queria se salvar. Continua bacana e de caráter imaculado. Perdeu-se, porém. É urgente que ele se encontre consigo próprio. Só então passará a ter sentimentos.
O segundo encontro foi rapidíssimo: coisa de tomar o mesmo elevador. Há muito tempo eu não via esta pessoa. E o que vi me agradou: era uma pessoa cansada porém em plena atividade.
O terceiro encontro – como nos Três mosqueteiros que na verdade são quatro – foi duplo: revi as duas filhas de Aluísio e Solange Magalhães. Uma tem meu nome e é engraçado a gente se falar. Parece que se está tendo o diálogo perfeito. Deu-me dois quadros por ela desenhados e em um deles escreveu: “Para Clarice de Clarice.” E havia a quarta mosqueteira que era Carolina. São o que se pode esperar de uma criança: limpidez e pureza e criatividade e afeto e naturalidade. Foi um encontro feliz.

Clarice Lispector, in Todas as crônicas

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