terça-feira, 11 de julho de 2023

Hollywood | 21


Passaram-se três ou quatro semanas.
Uma noite, o telefone tocou. Era Jon.
Como está você? Como está Sarah?
Estamos bem. Você está vivo?
Estou. A Dança de Jim Beam também. Francine Bowers leu o argumento e adorou. Chegou a reduzir uma fatia de seu salário habitual pra fazer ele. Jack também, mas não diga a ninguém.
Claro, mas por que essas reduções?
Estamos negociando com a Firepower Productions, Harry Friedman e Nate Fischman. Eles negociam duro, mas está tudo assinado. Teve um problema, porque o agente de Jack exigiu no contrato uma cláusula “faça ou pague”.
Que é isso?
Isso quer dizer que Jack receberá a grana dele quer o filme seja feito ou não. A maioria dos grandes astros tem essa cláusula nos contratos.
É difícil acreditar que vá existir um filme.
Tom Pell teve muito a ver com isso, quando se ofereceu pra fazer a coisa por um dólar. Deu ao projeto um pouco de crédito.
Eu gostaria que a gente tivesse o Tom...
Bem, ele ajudou. Quando Jack soube que Tom queria fazer o filme por um dólar, se interessou. A Firepower se interessou. Tivemos sorte.
Sabe o que disse Lippy Leo Durocher?
Quem é esse?
Um jogador de bêisebol dos velhos tempos. Ele disse: “Prefiro ter sorte a ser bom de bola.”
Eu acho que a gente tem sorte e é bom de bola.
Talvez. Mas quem são esses caras da Firepower?
São novos em Hollywood. Marginais. Ninguém sabe qual é a deles. Faziam filmes de exploração na Europa. Chegaram aqui da noite pro dia e começaram a fazer filmes às dezenas, um atrás do outro. Todo mundo odeia eles. Mas eles fazem negócios, embora negociem duro.
Pelo menos pegaram Jim Beam.
É, quando ninguém mais queria. Eles têm um prédio enorme em North Hollywood. Entrei no escritório e lá estava Harry Friedman sentado. “Você tem Bledsoe e Bowers?”, perguntou. “Tenho”, eu disse. “Tudo bem”, ele disse, “a gente tem um filme.” “Mas não quer ler o argumento?”, eu perguntei. “Não”, ele disse.
Cara interessante.
Hollywood odeia ele.
É uma pena...
Você devia ver ele. Um homem gordão. A propósito, vai dar uma festa de aniversário na casa dele quinta à noite. Você e Sarah devem ir. O sócio dele, Nate Fischman, vai estar lá também...
Nós iremos. Me dê o endereço...
Dez minutos depois, o telefone tornou a tocar.
Hank, aqui é Tim Ruddy, eu sou um dos produtores de Jim Beam.
Trabalha pra Firepower?
Não, trabalho com Jon. Somos coprodutores. Eu e Lance Edwards.
Oh...
De qualquer modo, você conhece Victor Norman?
Li os livros dele.
É, ele leu os seus também. Ele vai escrever e dirigir um filme pra Firepower. E vai à festa. Quer saber se você pode dar uma passada no Chateau Marmont pra se encontrar com ele e irem à festa juntos.
Qual é o número da suíte dele?

Naquela quinta-feira, fomos até o Chateau Marmont. O criado pegou nosso carro e nos dirigimos à entrada. Um homem sorridente, meio calvo, nos aguardava. Era Tim Ruddy. Fizeram-se as apresentações, e entramos atrás dele. Victor Norman respondeu à nossa batida. Gostei dos olhos dele. Parecia calmo e por dentro.
Apresentações. Sarah estava com uma ótima aparência. Norman mostrou-se radiante com ela.
Apertei a mão dele e disse:
O bebum conhece o campeão.
Ele gostou disso.
Victor Norman era talvez o romancista mais conhecido dos Estados Unidos. Aparecia constantemente na TV. Era volúvel e hábil com a palavra. O que eu mais gostava nele era que não tinha medo das feministas. Era um dos últimos defensores da masculinidade e dos colhões no país. Para isso era preciso ter raça. Eu nem sempre gostava de sua produção literária, mas tampouco gostava sempre da minha.
Me deram a maior suíte da casa com desconto. Disseram que era boa publicidade. Mas, de qualquer maneira, a Firepower paga a conta.
Fomos com ele para a sacada. Uma puta de uma vista de uma puta de uma cidade.
Fazia frio ali fora.
Escuta, cara – perguntei – a gente não tem nada pra beber por aqui?
Acompanhamos Victor pelos vastos aposentos intercomunicantes. Ali dentro, a gente se sentia protegido de tudo. Uma fortaleza de segurança. Legal, legal.
Victor voltou com uma garrafa de vinho.
Achei uma garrafa mas nenhum saca-rolhas dando sopa...
Ah, deus – suspirei. Um bêbado amador.
Victor Norman estava no telefone.
Precisamos de um abridor. Um saca-rolhas... Um pouco mais de vinho... Algumas garrafas de...
Olhou-nos.
O vinho demorou algum tempo a chegar.
Vou fazer dois filmes pra Firepower. Vou escrever e dirigir um. E vou atuar no outro. Jon-Luc Modard é quem vai dirigir. Espero me dar bem com ele.
Boa sorte – eu disse.
Seguiu-se uma conversa sem importância. Victor nos contou como conhecera Charlie Chaplin. Era uma história boa, louca e engraçada.
O vinho chegou e nos sentamos. Sarah e Tim Ruddy puseram-se a conversar. Ela sentia que ele se sentia de fora e tentava animá-lo. Era boa nisso. Eu, não tanto.
Victor olhou-me.
Está fazendo alguma coisa agora?
Fodendo com um poema.
Ele pareceu um pouco triste.
Me pagaram um milhão de dólares pra escrever meu próximo romance. Isso foi há um ano. Não escrevi uma página e o dinheiro já acabou.
Nossa.
Nossa não vai ajudar.
Eu soube das pensões alimentícias, todas as ex-esposas...
Ééé...
Aproximei meu copo dele. Estava vazio. Ele tornou a enchê-lo.
Eu soube de suas bebedeiras...
Ééé...
Que são essas coisas que você fuma?
Beedi’s. Da Índia. Enrolados por leprosos.
É mesmo?
O vinho rolava e o tempo passava.
Bem, acho que é melhor irmos indo pra festa – disse Victor Norman.
Podemos ir no meu carro.
Tá legal.
Descemos. Tim Ruddy queria ir no seu próprio carro.
O criado trouxe meu carro. Dei-lhe uma gorjeta e Sarah entrou. Arranquei e fomos para a festa de aniversário de Harry Friedman.
Eu também tenho um BMW preto – disse Victor Norman.
Os caras durões dirigem BMWs pretos – eu disse.

Charles Bukowski, in Hollywood

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