quinta-feira, 6 de julho de 2023

A quinta viagem

Ontem à noite, ditou seu último testamento. Esta manhã perguntou se tinha chegado o mensageiro do rei. Depois, dormiu. Ouviram-no proferir disparates e murmúrios de queixa. Ainda respira, mas respira bronco, como se lutasse contra o ar.
Na Corte, ninguém escutou suas súplicas. Da terceira viagem tinha regressado preso, amarrado com correntes, e na quarta viagem não houvera quem fizesse caso de seus títulos e dignidades.
Cristóvão Colombo vai embora sabendo que não há paixão ou glória que não conduza à pena. Não sabe, em compensação, que poucos anos faltam para que o estandarte que ele cravou, pela primeira vez, nas areias do Caribe, ondule sobre o império dos astecas, em terras ainda desconhecidas, e sobre o reino dos incas, sob os desconhecidos céus do Cruzeiro do Sul. Não sabe que ficou curto em suas mentiras, promessas e delírios. O Almirante-Mor do Mar Oceano continua acreditando que chegou à Ásia pelas costas.
Não se chamará o oceano mar de Colombo. Tampouco levará seu nome o novo mundo, e sim o nome de seu amigo, o florentino Américo Vespúcio, navegante e mestre de pilotos. Mas foi Colombo quem encontrou essa deslumbrante cor que não existia no arco-íris europeu. Ele, cego, morre sem vê-la.

Eduardo Galeano, in Os Nascimentos

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