sexta-feira, 21 de abril de 2023

As rosas não falam | Cartola, 1976


Com fluidez, lirismo sintético e uso perfeito do idioma culto, a letra deste samba está à altura de qualquer mestre da poesia parnasiana. Sim, o estilo nascido no fim do século XIX na França, e que teve tantos adeptos no Brasil até a revolução estética da Semana de Arte Moderna, em 1922, estava entre as referências de Cartola, o genial sambista que teve direito a uma segunda grande chance na vida.
As rosas não falam”, um samba lento em clima de choro, lançado em disco por Beth Carvalho, em julho de 1976 e logo em seguida também gravado pelo compositor, é fruto dessa volta por cima do sambista da Mangueira.
Depois de um início promissor entre os bambas do samba nos anos 1930 e 1940, Cartola sumiu por mais de uma década, foi dado como morto. Até 1956, quando o jornalista Sérgio Porto encontrou-o lavando carros numa rua de Botafogo e levou suas músicas a cantores e produtores, trazendo-o de volta ao sucesso com a gravação de Nara Leão de “O sol nascerá”.
No início dos anos 1960, comandou com a mulher Zica o restaurante e casa de samba Zicartola, na rua da Carioca, que se tornou um templo do melhor samba do Rio, para cair mais uma vez no esquecimento. Mas voltou na década seguinte com um baú cheio de novas e surpreendentes músicas, com um grau de acabamento e sofisticação ainda maior do que seus primeiros sucessos. Gravado por Paulinho da Viola, Beth Carvalho e Clara Nunes, Cartola também gravou na independente Marcus Pereira (1974) seu primoroso primeiro álbum solo, com pérolas como a confessional “Tive sim” e a canção de despedida “Acontece”.
Dois anos depois, gravou um segundo disco em que, além de “As rosas não falam”, se destacam “O mundo é um moinho”, “Sala de recepção”, “Peito vazio”, “Cordas de aço” e “Ensaboa”, regravada com sucesso por Marisa Monte em clima de afropop em 1990.

Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil

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