quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Todos os nomes

Dia 20 de novembro de 2008

A dedicar exemplares de A viagem do elefante na editora durante uma boa parte da manhã. Na sua maioria irão ficar em Portugal como um recado para os amigos e companheiros de ofício dispersos nas lusitanas paragens, mas outros viajarão a terras distantes, como sejam o Brasil, a França, a Itália, a Espanha, a Hungria, a Roménia, a Suécia. Neste último caso, os destinatários foram Amadeu Batel, nosso compatriota e professor de literatura portuguesa na Universidade de Estocolmo, e o poeta e romancista Kjell Espmark, membro da Academia Sueca. Enquanto dedicava o livro para Espmark recordei o que ele nos contou, a Pilar e a mim, sobre os bastidores do prémio que me foi atribuído. O Ensaio sobre a cegueira, já então traduzido ao sueco, havia causado boa impressão nos académicos, tão boa que ficou praticamente decidido entre eles que o Nobel desse ano, 1998, seria para mim. Acontece, porém, que no ano anterior tinha publicado outro livro, Todos os nomes, o que, obviamente, em princípio, não deveria constituir obstáculo à decisão tomada, a não ser uma pergunta nascida dos escrúpulos dos meus juízes: “E se este novo livro é mau?”. Da resposta a dar encarregou-se Kjell Espmark, em quem os colegas depositaram a responsabilidade de proceder à leitura do livro no seu idioma original. Espmark, que tem certa familiaridade com a nossa língua, cumpriu disciplinadamente a missão. Com o auxílio de um dicionário, em pleno mês de Agosto, quando mais apeteceria ir navegar entre as ilhas que enxameiam o mar sueco, leu, palavra a palavra, a história do funcionário Sr. José e da mulher a quem ele amou sem nunca a ter visto. Passei o exame, afinal o livrinho não ficava nada atrás do Ensaio sobre a cegueira. Uf!

José Saramago, in O caderno

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