A
felicidade só existe naquele minuto trinta e sete em que o Dorflex
faz efeito e a nuca deixa de ser o pufe para os pés de um demônio
gordo.
Só
existe no décimo quarto dia do Efexor, quando os dedos dos pés se
tornam fios desencapados e você sabe que só lhe resta dançar. Uma
minhoca cósmica efervescente seduz todos os seus órgãos e termina
em raios purpurinados nas pontas duplas do cabelo e você precisa
dançar. Dançar como numa tribo, dançar como se suas ancas fossem
escravas felizes açoitadas por uma música invisível, dançar como
se o planeta estivesse há um século sem chuva e só você pudesse
enfeitiçá-lo. Aonde foi fulano? Dançar no banheiro da firma,
escondido. Você precisa dançar. Suas pernas não servem para mais
nada a não ser isso: você sozinha deslizando a meia pelo piso da
cozinha. Sim, você ficará gorda, e ficará anorgásmica, e ficará
olhando estática uma amiga te contar: “morreram num acidente”,
enquanto pensa: “tá, mas preciso comer, cadê o risoto à
carbonara que pedi?”, e ficará cínica ao ver qualquer filme em
que, “mesmo se amando, eles não conseguiram”. Mas você vai
querer dançar.
Só
existe no minuto dezessete do Rivotril sublingual 0,25 mg. Quando o
dedo empurrando suas amígdalas, “engula-se, seu puto”, prefere
desencanar e apontar para as estrelas. O mundo cheirando a uma chuva
fina que caiu sobre uma horta de manjericão fresco, todas as quinas
do mundo com “protetor fofinho pra criança não se machucar”. Se
você meter logo dois sublinguais, o que, vamos combinar, dá apenas
meio remédio, é como se Jesus (não esse, mas aquele numa versão
mais legal) e a sua mãe (não essa, mas aquela numa versão mais
legal) celebrassem um ao outro, numa facção de proteção e bondade
extremas, para te rodopiar docemente numa valsa celeste.
Só
existe de verdade quando bate o tucundundum do “tô nem aí,
mundão”, mas para isso é preciso misturar Dorflex com Efexor com
Rivotril e… com um Dramin. Não aconselho, pois pode dar misto de
demência e labirintite e pressão baixa — o que meu psiquiatra
chamou de “cê tá louca, idiota, podia ter morrido, imbecil”.
Não
acredito em nenhuma droga feita por “marcas” como Duda Maluco,
Noinha, Zé do Branco e Piolho do Pavilhão. As boas drogas têm SAC.
Tati Bernardi, in Depois a louca sou eu
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