domingo, 27 de novembro de 2022

Canto de Ossanha | Baden Powell e Vinicius de Moraes, 1966


Com a bossa nova já decadente no Brasil e seu parceiro Tom Jobim morando nos Estados Unidos, Vinicius de Moraes mudou de novo o rumo da música brasileira quando criou com o violonista Baden Powell o afro-samba, um estilo oposto à bossa nova branca e carioca, inspirado pelos ritmos e cantos de candomblé da Bahia e pelo mundo mágico dos orixás.
Os primeiros afro-sambas, “Consolação” e “Berimbau”, caíram como bombas de ritmo sobre o intimismo da bossa nova. O fraseado musical ecoava cantos ancestrais, cheios de dramaticidade e tensões que explodiam em refrões abertos e festivos, cantados em coro com Elis Regina e Jair Rodrigues pelos auditórios do programa O fino da bossa e também gravados com sucesso pelo Quarteto em Cy e pelo Tamba Trio.
Tudo começou em 1962, quando Vinicius, empolgado com discos de cantos de candomblé da Bahia presenteados pelo poeta Carlos Coqueijo, encontrou Baden, recém-chegado de uma viagem a Salvador, onde ficara fascinado com os ritmos e os cantos dos terreiros. Além de anunciar o novo estilo, “Berimbau” e “Consolação” foram grandes sucessos populares como um novo caminho da música brasileira.
Vinicius, que se dizia o branco mais preto do Brasil, e Baden, um mulato carioca que era o maior violonista do momento, viveram três meses num belíssimo apartamento da mulher do Poetinha no Parque Guinle. Após dezenas de litros de uísque, saíram com os primeiros 25 afro-sambas, entre eles o clássico “Canto de Ossanha”.
O canto da mais difícil / E a mais misteriosa das deusas / Do candomblé baiano / Aquela que sabe tudo / Sobre as ervas / Sobre a alquimia do amor.”
Baden e Vinicius continuaram compondo até 1966, quando gravaram o disco histórico, com oito afro-sambas, arranjos do maestro Guerra Peixe e vocais do Quarteto em Cy – um dos melhores e mais influentes discos da história da música brasileira.
No texto de apresentação, Vinicius dizia que Baden “conseguiu carioquizar, dentro do samba moderno, o candomblé afro-brasileiro, dando-lhe, ao mesmo tempo, uma dimensão mais universal”.

Nelson Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil

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