Minha
mãe morrera um ano antes. Uma semana após a morte de meu pai, eu
estava na casa dele, sozinho. Era em Arcadia, e o mais perto que eu
chegara daquela casa em algum tempo fora ao passar pela autoestrada a
caminho de Santa Anita.
Eu
era desconhecido para os vizinhos. O funeral acabara, e eu me dirigi
à pia, enchi um copo d’água, bebi-o, depois saí.
Sem
saber que outra coisa fazer, peguei a mangueira, abri a água e
comecei a aguar os arbustos. Cortinas correram enquanto eu estava
parado no gramado da frente. Depois eles começaram a sair de suas
casas. Uma mulher veio do outro lado da rua.
– Você
é Henry? – ela me perguntou.
Respondi-lhe
que era Henry.
– Conhecíamos
seu pai há anos.
Aí
o marido aproximou-se.
– Conhecemos
sua mãe também – ele disse.
Eu
me curvei e fechei a mangueira.
– Não
querem entrar? – perguntei.
Eles
se apresentaram como Tom e Nellie Miller, e entramos em casa.
– Você
é a cara do seu pai.
– É,
é o que me dizem.
Sentamo-nos
e ficamos olhando uns para os outros.
– Oh
– disse a mulher –, ele tinha tantos quadros. Devia gostar de
quadros.
– É,
gostava, né?
– Eu
adoro aquele quadro do moinho no pôr do sol.
– Pode
ficar com ele.
– Oh,
posso?
A
campainha tocou. Eram os Gibsons. Eles me disseram que também tinham
sido vizinhos de meu pai durante anos.
– Você
é a cara do seu pai – disse a Sra. Gibson.
– Henry
nos deu o quadro do moinho.
– Isso
é ótimo. Eu adoro aquele quadro do cavalo azul.
– Pode
ficar com ele, Sra. Gibson.
– Oh,
não está falando sério.
– Sim,
está tudo bem.
A
campainha tornou a tocar, e outro casal entrou. Deixei a porta
entreaberta. Logo um homem enfiou a cabeça.
– Eu
sou Doug Hudson. Minha esposa está no cabeleireiro.
– Entre,
Sr. Hudson.
Outros
chegaram, a maioria aos pares. Começaram a circular pela casa.
– Vai
vender a casa?
– Acho
que vou.
– É
um bairro adorável.
– Estou
vendo.
– Oh,
eu adoro aquela moldura, mas não gosto do quadro.
– Leve
a moldura.
– Mas
que vou fazer com o quadro?
– Jogue
no lixo. – Olhei em volta. – Se alguém vir um quadro que goste,
por favor, leve.
Pegaram.
Em breve as paredes estavam nuas.
– Você
precisa dessas cadeiras?
– Não,
na verdade, não.
Passantes
entravam da rua, e nem todos se davam o trabalho de apresentar-se.
– E
o sofá? – perguntou alguém em voz muito alta. – Você quer?
– Não
quero o sofá – eu disse.
Levaram
o sofá, depois a mesa do café da manhã e as cadeiras.
– Tem
uma torradeira aí, não tem, Henry?
Levaram
a torradeira.
– Não
precisa dos pratos, precisa?
– Não.
– E
a prataria?
– Não.
– E
a chaleira e o liquidificador?
– Levem.
Uma
das senhoras abriu um armário na varanda dos fundos.
– E
todas essas frutas em conserva? Você jamais vai poder comer tudo
isso.
– Tudo
bem, peguem todos um pouco. Mas tentem dividir igualmente.
– Oh,
eu quero os morangos!
– Oh,
eu quero os figos!
– Oh,
eu quero a geleia!
As
pessoas saíam e voltavam, trazendo outras consigo.
– Escuta,
tem uma garrafa de uísque aqui no armário! Você bebe, Henry?
– Deixe
o uísque.
A
casa estava ficando lotada. A descarga do banheiro funcionou. Alguém
derrubou um copo da pia e quebrou-o.
– É
melhor ficar com esse aspirador, Henry. Pode usar ele em seu
apartamento.
– Tudo
bem, vou ficar.
– Ele
tinha umas ferramentas de jardinagem na garagem. E elas?
– Não,
é melhor eu ficar com essas.
– Dou
quinze dólares pelas ferramentas de jardinagem.
– Tudo
bem.
Ele
me deu quinze dólares e eu lhe dei a chave da garagem. Em breve se
podia ouvi-lo rolando o aparador de grama para sua casa no outro lado
da rua.
– Você
não devia ter vendido todo aquele equipamento a ele por quinze
dólares, Henry. Valia muito mais.
Não
respondi.
– E
o carro? Já tem quatro anos.
– Acho
que vou ficar com o carro.
– Dou
cinquenta dólares por ele.
– Acho
que vou ficar com o carro.
Alguém
enrolou o tapete da sala da frente. Depois disso, começaram a perder
o interesse. Em breve restavam apenas três ou quatro, depois
foram-se todos. Deixaram-me a mangueira do jardim, a cama, a
geladeira e o fogão, e um rolo de papel higiênico.
Saí
e fechei a porta da garagem. Dois meninos passaram de patins. Pararam
quando eu fechava as portas da garagem.
– Está
vendo aquele cara?
– Estou.
– O
pai dele morreu.
Foram
em frente. Eu peguei a mangueira, abri a torneira e comecei a aguar
as rosas.
Charles Bukowski, in Numa Fria
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