Vinicius
e Tom no bar onde escreveram “Garota de Ipanema”, com a partitura
da canção ao fundo
É
a música brasileira mais conhecida no mundo, uma das cinco canções
mais tocadas de todos os tempos.
E
tudo começou quando Vinicius de Moraes e Tom Jobim tomavam chope e
jogavam conversa fora no Bar Veloso (atual Garota de Ipanema), na
esquina da rua Montenegro, em Ipanema – que futuramente seria
rebatizada de Vinicius de Moraes –, quando viram passar a jovem
Heloisa Eneida, com seu corpo perfeito e um biquíni mínimo,
gingando a caminho do mar.
Depois
de várias tentativas de letra de Vinicius, finalmente a “Garota”
foi apresentada ao público no histórico show Encontro, na boate Au
Bon Gourmet, que reuniu o time de sonhos da bossa nova: João
Gilberto, Tom Jobim, Vinicius de Moraes (ainda diplomata, em sua
primeira experiência como cantor) e Os Cariocas, que estreou em 2 de
agosto de 1962.
Em
cartaz por 45 dias com sucesso absoluto, o show desmentia a voz
corrente que dizia não haver nada mais velho do que a bossa nova,
desgastada e vulgarizada por uma exposição maciça na publicidade e
pela exploração de oportunistas que surfavam na onda sem ter nada a
ver com aquele estilo.
Mas
a “Garota de Ipanema” de Tom e Vinicius, quintessência da bossa
nova, foi um sucesso imediato, que cresceu em progressões
geométricas. No início de 1963, foram lançadas as três primeiras
gravações: do cantor Pery Ribeiro, de Os Cariocas e do Tamba Trio.
Em maio daquele ano, seria a vez da primeira com Tom Jobim, em versão
instrumental, para seu disco solo de estreia nos Estados Unidos, no
selo de jazz Verve: The Composer of Desafinado Plays.
Até
o fim daquele ano, saíram 18 outras gravações de “Garota de
Ipanema” no Brasil e nos Estados Unidos, incluindo as de jazzmen de
alto prestígio como Charlie Byrd, Herbie Mann e Stan Getz. O álbum
Getz/Gilberto – Featuring Antonio Carlos Jobim, que reunia o
saxofonista com o violão e a voz de João Gilberto, o piano
minimalista de Tom, o contrabaixo de Tião Neto e a bateria de Milton
Banana, impulsionou o sucesso internacional da canção.
Em
meio às sessões, o produtor Creed Taylor sugeriu que o disco também
incluísse uma versão em inglês. Como João não tinha intimidade
alguma com o idioma de Shakespeare, sua mulher, Astrud, que nunca
gravara até então, foi escalada para a missão. Como estamos
cansados de saber, lançada num single no fim de 1963, “The girl
from Ipanema” arrombou a festa. Em pleno 1964, quando Beatles,
Stones, Dylan e companhia já começavam a ditar as novas ordens e
modas no mundo pop, a gravação de Getz e dos Gilbertos chegou ao
quinto lugar na lista pop (a Hot 100) e ao primeiro na de Easy
Listening. No início de 1965, a ipanemense também roubou a festa na
cerimônia de entrega do Grammy, levando o troféu de Gravação do
Ano, enquanto Getz/Gilberto ficou com três outros, incluindo
o de Álbum do Ano – pela primeira vez na história do Oscar da
música um disco de jazz, e também com um artista não americano,
vencia nessa categoria.
Inicialmente
batizada de “Menina que passa”, a canção tinha sido criada para
um musical que Vinicius planejava mas não chegou a terminar, Blimp.
A versão em inglês de Norman Gimbel carimbou o passaporte para sua
viagem sem fim e rendeu alguma discussão entre Tom e o americano.
Este não via sentido em manter o nome do bairro/praia até então
desconhecido fora dos limites cariocas. Tom bateu o pé, não
aceitava transformá-la numa garota de South Beach, Malibu ou
qualquer outra chique e famosa dos Estados Unidos. Logo, falantes
anglo-saxões aprenderam a cantar Ipanema, assim como franceses,
japoneses, turcos, russos, marcianos. O Rio agradece.
Se
o bairro não mudou, o sexo da musa, sim. Já em 1964, a cantora de
jazz Peggy Lee regravou-a como “The Boy from Ipanema”, gênero
também usado por intérpretes como Ella Fitzgerald, Shirley Bassey
e, mais recentemente, Diana Krall. E “Garota de Ipanema” (e suas
versões “girl” ou “boy”) se tornou a segunda canção
popular mais regravada no mundo, atrás apenas de “Yesterday”, de
uns tais de Lennon & McCartney.
Comercialmente,
“Garota de Ipanema” pode ter sido o auge da dupla Tom &
Vinicius, mas também sinalizou o começo do fim. Após o sucesso,
eles só fizeram mais duas canções juntos: “Olha Maria”, em
1970, junto com Chico Buarque, e, lançada na mesma época, “Chora
coração”, a única com letra na arrebatadora trilha sonora do
filme A casa assassinada, de Paulo César Saraceni.
Nelson Motta, in As 101 canções que tocaram o Brasil
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