Escrever
contos
muito
pouco tem a ver
com
contar casos
que
ouvimos na rua,
soubemos
por amigos,
jornais
ou pela tevê.
Um
conto é um corte
na
pele fina do hoje
e
ele sangra tanto
que,
para estancá-lo,
resta-nos
o manto
de
termos cotidianos.
Não
escreva contos
para
fazer graça.
Só
admita a piada
quando
amarga.
A
tristeza do tempo
que
nunca para,
mesmo
o amor maior
nos
espeta o peito
com
a pior farpa.
Conto
repele risadas.
Isso
é para a crônica
que
ajuda a digerir
as
comidas pesadas.
Apenas
escreva contos
em
estado de fúria,
com
um ódio santo
contra
toda a turba.
Um
conto necessário
é
um ato de cura,
catarse
em meio
à
insanidade de tudo.
Escreva
contos para
emudecer
esse mundo
tomado
pela usura.
Não
escreva contos
como
quem brinca
com
palavras móveis,
incrustáveis
nas frases.
Conto
já nasce pronto.
Todo
esforço vem antes,
ao
se sofrer o corte
e
sangrar até a morte.
Não
é com palavras
que
se faz um conto,
mas
com o sentimento
de
tantos desencontros
entre
o eu e o mundo,
mesmo
quando o mundo
é
quem um dia fomos.
Tente
escrever um conto
que
te prepare um pouco
para
te ver como morto.
Estar
vivo é algo falso
porque
breve em demasia.
Todo
conto é um canto,
um
canto de despedida.
Não
escreva contos
com
palavras eruditas.
Conto
é linguagem viva,
a
mesma usada no bar,
na
hora do namoro,
no
balcão da padaria.
Palavras
do dia a dia
súbito
se concentram
e
dizem de uma vez algo
que
ninguém mais diria.
Escreva
os seus contos
como
quem se suicida
sem
deixar bilhetes
dando
os tais motivos.
Um
conto não se explica.
É
morte imprevisível,
a
vida como enigma,
a
força de um mistério
que
nunca silencia.
Só
escreva os seus contos
quando
não houver quando.
Miguel Sanches Neto
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