[1]
Como
em casa o dinheiro andava a cavalo e a gente andava a pé, quando
chegava um filme no acampamento da Mina e meu pai – só pelo nome
do ator ou da atriz principal – achava que parecia ser bom, as
moedas eram juntadas uma a uma, o preço exato da entrada, e me
mandavam assistir.
Depois,
ao voltar do cinema, eu tinha de contar o filme para a família
inteira reunida na sala.
[2]
Era
lindo, depois de ver o filme, encontrar meu pai e meus irmãos me
esperando ansiosos em casa, sentados enfileirados que nem no cinema,
penteadinhos e de roupa limpa, recém-mudada.
Meu
pai, com uma manta boliviana cobrindo as pernas, ocupava a única
poltrona que a gente tinha, e assim era a plateia lá de casa. No
chão, do lado da poltrona, brilhava sua garrafa de vinho tinto e o
único copo que havia sobrado em casa. A galeria era aquela bancada
comprida, de madeira bruta, onde meus irmãos se acomodavam em ordem,
do menor ao maior. Depois, quando alguns de seus amigos começaram a
aparecer na janela, a janela virou o balcão.
Eu
chegava do cinema, tomava rapidinho uma xícara de chá (que deixavam
pronto me esperando) e começava a minha função. De pé na frente
deles, de costas para a parede pintada a cal, branca feito a tela do
cinema, começava a contar o filme “de a a z”, como dizia meu
pai, tratando de não esquecer nenhum detalhe, nem da história, nem
dos diálogos, nem dos personagens.
Aliás,
devo esclarecer aqui que não me mandavam para o cinema só por ser a
única mulher da família e eles – meu pai e meus irmãos – serem
cavalheiros com as damas. Não senhor. Eles me mandavam porque eu era
a melhor contando filmes. Assim mesmo, como se ouve: a melhor
contadora de filmes da família. Depois, passei a ser a melhor da
viela e em pouco tempo a melhor do povoado. Que eu saiba, não havia
ninguém no povoado da Mina que ganhasse de mim na hora de contar
filmes. Do tipo que fosse: de caubóis, de terror, de guerra, de
marcianos, de amor. E, claro, os filmes mexicanos, que eram os que
papai, como todo mundo que tinha vindo do sul, mais gostava.
E
foi justamente com um filme mexicano, desses cheios de cantorias e
muito choro, que ganhei meu título. Não foi nada fácil ganhar esse
título.
Ou
vocês acham que fui eleita só por causa da minha fina estampa?
Hernán Rivera Letelier, in A Contadora de Filmes
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