A
valsa de Pixinguinha repousava esquecida na voz de Orlando Silva até
Marisa Monte relançá-la em 1991, acompanhada pelo pianista e
compositor japonês Ryuichi Sakamoto, em seu segundo álbum solo,
Mais.
Uma
façanha surpreendente, porque, se a belíssima melodia de
Pixinguinha era de construção sofisticada, a enorme letra de Otávio
de Souza já soava arcaica quando foi lançada por Orlando Silva em
1937. Tanto na construção rebuscada das frases quanto no abuso de
palavras que começavam a cair em desuso, hoje relegadas aos
dicionários, como “olor”, “lanceado”, “remir”, “olente”…
Mas as literatices inflamadas não impediram o retumbante sucesso na
época, em grande parte ajudado por “Carinhoso”, o lado A do 78
rpm lançado pela RCA Victor.
“Tu
és divina e graciosa / Estátua majestosa do amor / Por Deus
esculturada / E formada com ardor / Da alma da mais linda flor / De
mais ativo olor / Que na vida é preferida pelo beija-flor.”
Orlando
teria conhecido as duas músicas quando participou de uma serenata a
convite de Pixinguinha. Era a festa de um casamento em Bangu, e a
certo momento da noite o compositor mostrou a letra que João de
Barro tinha feito para o choro “Carinhoso” e também a então
inédita “Rosa”. Faro apurado, Orlando quis gravar as duas, o que
fez numa única sessão, em 28 de maio de 1937, para o disco lançado
um mês depois.
Na
época da gravação de Orlando Silva, compositores como Noel Rosa,
Ary Barroso e Lamartine Babo já tinham incorporado com sucesso a
linguagem coloquial das ruas às suas canções, muitas delas usando
construções e termos que poderiam ser escritos hoje. Apesar de seu
romantismo exacerbado (ou por isso mesmo), “Rosa” bateu fundo no
coração do público de Orlando. E refloresceu mais bela ainda cinco
décadas depois na voz de Marisa, em gravação intimista, que contou
apenas com o piano e os teclados de Sakamoto e a cuíca de Armando
Marçal.
Nelson
Motta, in 101 canções que tocaram o Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário