quarta-feira, 2 de março de 2022

Alfafa para os magrinhos!

Quinze quilos de maconha foram queimados ontem no Instituto de Pesquisas Biológicas.
Até 1969 (não recordo com precisão a data da lei), não constituía crime o consumo de maconha, apenas o traficante era punido. E nisto já havia uma contradição: se não era criminoso o consumo, porque proibir o tráfico?
Hoje a contradição legal deixou de existir, quem fuma também vai para a prisão. Quem fuma maconha, bem entendido. Pois destruir brônquios e pulmões com o cigarro não é considerado crime. Pelo contrário, dá status e é característica de homens que sabem o que querem.
Não sei se algum dia entenderei o que se passa na cabeça de um legislador. O que sei é que eles não aprendem nada da História. Houve época em que o café era considerado tóxico, só homens — e olhe lá — podiam bebê-lo. Bach, se não me engano, tem uma cantata, a Cantata da Moça que Tomava Café, o que na época, era inadmissível numa moça de família. Quem imaginaria hoje que o cafezinho nosso de cada dia já teve tal fama?
Divertida justiça que um rio limita, erro aquém, verdade além dos Pirineus, disse outro cronista também perplexo. Já estive em país onde a municipalidade financia bares para que os jovens se reúnam para degustar a canabis. Em alguns bares, há um aviso na porta: “Proibida a entrada a maiores de 18 anos”.
Enfim, cada cabeça uma sentença.
Em outubro de 71, noticiou-se na crônica policial dos jornais uma ocorrência que merece uma atenção maior das pessoas que se preocupam com o problema do tóxico. Otacílio de Oliveira Escobar, residente em um modesto barraco da vila Cai n’Água, foi preso por tráfico de maconha. Os policiais que foram apreender a muamba no barraco do Otacílio encontraram quilos e quilos de esterco bovino, seco e esfarelado.
Segundo Otacílio, os clientes nunca reclamaram da qualidade da mercadoria. Pelo contrário, “os amizades ficavam pirados, todo mundo muito louco”. Um dos clientes comentou o cheiro da erva, considerado fora do comum. Otacílio tranquilizou-o:
É erva nordestina. Da boa. Muito mais forte.
E mais pirado ainda ficou o magro.
Conheço outra historinha ainda. A de uma moça que ofereceu a um magrinho um cristal de LSD. O magro subiu pelas paredes, sem saber que havia ingerido partículas de grafite.
Não tenho nada contra os assim chamados tóxicos, tampouco contra a magrinhagem. Gente boa como Freud, Huxley e Van Gogh curtiam certos estimulantes. Já afirmei diversas vezes que certas drogas podem excitar o cérebro, quando se tem cérebro. O que me entristece, é ver toda uma geração que não sabe mais falar, que nem sabe fazer amor, encerrados dentro de si mesmos, olhando para o próprio umbigo. Se ao menos fosse para o umbigo do outro, talvez nesse olhar já existisse o germe de uma comunicação.
Minha modesta sugestão aos homens preocupados com os tóxicos: que tal oficializar o consumo da maconha? Não se forneceria maconha aos magros, é claro. Nem estou sugerindo esterco de vaca, gosto muito deles para sugerir isto. Mas que tal alfafa? Por um lado, entre a canabis sativa e a medicago sativa a magrinhagem não faz distinção alguma. Por outro, seria um estímulo à agricultura gaúcha.

Janer Cristaldo, in A Força dos Mitos 

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