O vizinho Lourenço
se conhecia por suas preguiças.
Nenhuma ocupação,
alguma vez, o ocupou.
Em moço,
ensonava os olhos,
negando a visão das belezas.
Ora, o amor, resmungava,
o que mais dá são cansaços.
E quando amou,
amou leve
para poupança de baba e suspiro.
No altar,
a noiva, em vão, esperou.
Subir a escadaria da igreja
era trabalho para muito joelho.
A si mesmo, Lourenço se explicou:
ora, o amor é o que, na gaiola, nos
dá asas.
Noites e noites,
perante insistência dos parentes,
olhando o fogo, respondia:
não posso, estou contando labaredas.
E de tanto
dos afazeres se desfazer,
certa vez anunciou:
viver,
não sei se gosto de viver.
A vida tira-me o sono.
Nessa noite,
se dispensou de si mesmo.
No final,
porém, não chegou a finar.
Morrer custava fadigas.
Mia Couto
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