Dentre as tantas lições que recebi e
recebo da minha mãe, considero duas primordiais: chore sempre que
quiser chorar, filha. Lute mesmo quando não quiser lutar, filha.
Sou filha de uma virginiana de origem
germânica, regras rígidas, poucas palavras. Mas não houve uma
única vez em que ela tenha me mandado engolir o choro, como tanto se
ouve por aí. Pelo contrário, ela dizia, com sua escassa e preciosa
doçura: “O choro é o xixi do coração, filha. Tem que deixar que
ele saia.” Aprendi a obedecer (porque não lhe obedecer segue sendo
o erro mais certo de todos) e choro invariavelmente, abandonando
constrangimentos e preocupação com olhares de terceiros.
Sobre a luta, ela nunca verbalizou.
Preferiu, nesse caso, ser apenas um exemplo permanente. Por vezes,
soltava frases duras como “Segure isso pelo chifre”, “Mostre
para o cavalo quem é o cavaleiro aqui”, “Mantenha só na sua mão
a chave da sua felicidade”, “Segure as rédeas da sua vida ou ela
vai para onde quiser” ou ainda “Deus nunca nos dá um fardo mais
pesado do que podemos aguentar”. As frases ficaram como marcas,
mas, no fundo, sempre bastou observá-la, no presente e no passado
corajoso.
Sua luta nunca foi barulhenta. Olhares.
Gestos. Frases curtas em tom de voz sereno e firme. Longas cartas
manuscritas. Venho, há anos, aprendendo nesse treinamento
inconsciente a duelar sem armas, a gritar sem som, a intimidar com os
olhos e a romper sem cortes.
Nunca a vi abandonar ideais, relativizar
princípios ou tolerar afrontas. Sempre a vi lutar pelo que acredita
e, sobretudo, por aqueles em quem acredita. Sempre a vi continuar
acreditando, embora com os olhos um pouco inchados, de quem chorou
por meia dúzia de minutos atrás da necessária porta do banheiro
(porque filhos podem chorar no seu colo, mas ela, mãe germânica,
chora sozinha).
Um dia ela me disse, em tom de
confidência, que me achava muito corajosa. Eu quis, com todas as
minhas forças, acreditar nesse elogio com o qual nunca nem ousaria
sonhar. Ainda não acredito. Ainda me julgo borboleta, cheia de
cores, leve, superficial e frágil. Ainda me tornarei como ela:
árvore, raiz, tronco, verde e vida.
Por enquanto, em tempos estranhos, em
campo minado, em terreno incerto, em pedras falsas e em total
incerteza na vida, sigo no choro sincero, sigo na luta honesta. Sigo
por mim, por ela, por tantos. Porque, como dizem por aí, luto só me
serve se for verbo. E assim seguimos caminhando.
Ruth Manus, in Um dia ainda vamos rir de tudo isso
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