Já escrevi muito sobre a minha geração,
eu sei. Mas as angústias persistem e, por isso, persistem os textos
também. Escrevi sobre o que temos de bom e o que temos de ruim.
Sobre nossas escravidões e também sobre as liberdades que não
estamos dispostos a negociar. Sobre defeitos e qualidades, como todo
ser humano.
Acontece que eu venho percebendo que meus
amigos se comportam todos de uma forma um pouco parecida,
independentemente de suas idades. Os de 20, de 25, de 30, de 35, de
40 e de 45. As únicas coisas que mudam são os salários, a hora de
dormir e a capacidade de tomar álcool. No resto, parecemos todos um
pouco iguais, ainda que muitos anos nos separem. Hábitos parecidos,
gostos parecidos, músicas parecidas.
Se perguntarmos aos nossos pais quem eles
eram aos 20 e aos 40, sem dúvidas eles narrarão pessoas
absolutamente diferentes. Mas parece que nós não somos assim. Ou
que, pelo menos, não queremos ser ou não aceitamos ser. Fingimos
que o correr dos anos não tem nada a ver conosco.
De fato a vida é um pouco injusta –
especialmente com as mulheres – quando permite que a gente alcance
alguma liberdade financeira aos 25 e, logo na sequência, aos 30, 30
e poucos, nos diga que devemos pensar em adquirir estabilidade e,
eventualmente, construir família. O que é isso? Cinco, oito anos de
liberdade para descobrirmos a vida e o mundo? Isso não parece
suficiente e muito menos justo.
Eu disse um dia, numa conversa com um
amigo, que nós deveríamos ter 25 anos durante uns vinte anos.
Depois disso a vida poderia seguir adiante. Vinte anos para correr
riscos, fazer escolhas erradas, gastar dinheiro de forma
inconsequente ou, de repente, quase nem ganhar dinheiro. Vinte anos
nos quais a preocupação fosse só o hoje e só nós mesmos. Mais
nada nem ninguém.
Mas comecei a perceber que a minha
geração decidiu, de alguma forma, colocar isso em prática, ainda
que contra a imposição do tempo. As pessoas fazem 28 anos e seguem
tendo 25. Fazem 33 e seguem com 25. Fazem 40 e seguem com 25. As
pessoas têm filhos e seguem com 25. São promovidas e seguem com 25.
Não estou dizendo que nós sejamos
irresponsáveis. Pelo contrário. Acho que a vida nos imputa tantas
responsabilidades profissionais tão cedo que buscamos refúgio
naquelas coisas nas quais podemos nos negar a crescer. Muitos evitam
filhos enquanto podem. Outros fogem dos relacionamentos sérios.
Vários se negam a se casar. Não porque não queiram filhos, nem
relacionamentos sérios, nem casamentos. Eles querem, mas não agora.
Não aos 30. Não aos 40. Não aos... E agora? Ainda dá tempo?
Parece que o tempo vem correndo atrás de
nós com uma foice. E que nossos avós não se incomodavam. E que
nossos pais se incomodavam, mas aceitavam. E que a gente resolveu
peitar o tempo. Seguimos com nossos exageros, nossos sonhos
presentes, nossos compromissos adiados.
Talvez a gente tenha descoberto uma forma
genial de moldar o tempo às nossas vidas e não o oposto, como todos
faziam. Mas talvez estejamos vivendo uma imensa ilusão que só
perceberemos, frustrados, aos 50 anos. Não sei. Sei que, por
enquanto, parece que está tudo bem. Bem ou mal, poderemos dizer que
vivemos tudo o que foi possível. E parece-me que viver o máximo
possível segue sendo uma ideia melhor do que viver cumprindo prazos
com excelência.
Ruth Manus, in Um dia ainda vamos rir de tudo isso
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