quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

A selva

        No meio de um sonho, o Pai dos índios uitotos vislumbrou uma neblina fulgurante. Naqueles vapores palpitavam musgos e líquens e ressoavam assovios de ventos, pássaros e serpentes.
O Pai pôde pegar a neblina, e a reteve com o fio de seu hálito. Tirou-a do sonho e misturou-a com a terra.
Cuspiu várias vezes sobre a terra neblinosa. No torvelinho de espuma ergueu-se a selva, abriram as árvores suas copas enormes e brotaram as frutas e as flores. Cobraram corpo e voz, na terra empapada, o grilo, o macaco, o tapir, o javali, o tatu, o cervo, o jaguar e o tamanduá. Surgiram no ar a águia-real, a arara, o urubu, o colibri, a garça-branca, o pato, o morcego...
A vespa chegou com muito ímpeto. Deixou sem rabo os sapos e os homens, e depois cansou-se.

Eduardo Galeano, in Os Nascimentos

Nenhum comentário:

Postar um comentário