terça-feira, 8 de setembro de 2020

Contículo

O avião sacudiu e o homem pegou a mão da mulher sentada ao seu lado.
Desculpe — disse o homem. — É que eu...
O senhor tem medo de voar, é isto?
É. Na verdade, medo não. Pavor.
O homem continuava apertando a mão da mulher. Ela disse:
Acalme-se. Foi só uma sacudida.
O avião deu outra sacudida. O homem gemeu e pediu:
Você pode me abraçar?
A mulher relutou, mas concordou. Envolveu o homem nos seus braços.
Obrigado — disse o homem. — Era o que a mamãe fazia, quando eu era garoto e nós viajávamos de avião.
Pronto, pronto — disse a mulher. — Está tudo bem.
Outra sacudida.
Eu posso agarrar o seu seio? — pediu o homem.
Meu seio?!
Para me lembrar da mamãe. Vai me dar mais segurança.
Pode — disse a mulher, abrindo a blusa para o homem segurar seu seio.
Nisso ouviu-se a voz da aeromoça avisando que era para apertarem os cintos de segurança porque o avião estava entrando numa zona de turbulência.
Ai, meu Deus — disse o homem. E para a mulher: — Comece a tirar a roupa!
Luís Fernando Veríssimo, in Os últimos quartetos de Beethoven

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