As
partes do todo que por natureza estão compreendidas no universo,
perecem necessariamente (entenda-se “perecem” no sentido de
“alteram-se”). Se isso é por natureza um mal e uma necessidade
para elas, o todo não estaria bem dirigido, estando as partes
sujeitas a alterar-se e sendo constituídas de molde a perecerem de
diversas maneiras. Teria a natureza o desígnio de fazer mal, ela
mesma, às suas próprias partes e de sujeitá-las ao mal e a
necessariamente permanecer no mal, ou ter-lhe-ia escapado que as
coisas acontecem assim? Ambas as hipóteses são incríveis. Mas
ainda que, não levando em consideração a natureza, se procurasse
explicar que as coisas são assim porque estão assim constituídas,
seria ridículo afirmar que as partes do todo estão naturalmente
constituídas para transformar-se e ao mesmo tempo admirar-se e
inquietar-se como se algo estivesse acontecendo contrariamente à
natureza, particularmente porque dessa dissolução saem os mesmos
elementos de que as coisas se compõem. De fato, ou se trata de uma
dispersão dos elementos de que elas se compõem, ou de uma mudança
do elemento sólido em substância de aspecto terreno, do gasoso em
substância aeriforme, de tal maneia que esses elementos são
reabsorvidos na razão universal, seja em decorrência de destruições
periódicas pelo fogo ou de renovação por transformações
infinitas. E não imagines que o sólido e o gasoso se criem por
ocasião de tua geração. Tudo isso recebeu seu influxo somente
ontem ou anteontem, vindo do alimento e do ar inspirado. Então esse
influxo sofre transformações que recebeu e não o que sua mãe deu
à luz. Supõe, todavia, que isso está estreitamente ligado à tua
própria constituição; nada há de incompatível, penso, com o que
disse há pouco.
Marco
Aurélio, in Meditações
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