Tive
professores inesquecíveis. Alguns são inesquecíveis pela beleza da
sua pessoa, por sua inteligência, pelo respeito aos alunos. Esses me
fazem sorrir. Outros se tornaram inesquecíveis por sua pequenez e
tolice. Esses me fazem rir. É o caso de um professor de geografia
que tive no curso científico. Ele tinha um caderninho onde estavam
escritas as aulas que tinha ditado por anos. Ele ditava, nós
copiávamos – nisso se resumia sua filosofia da educação. De tudo
o que ele ditou, uma única coisa ficou gravada na minha memória, de
tão ridícula. Falando sobre a importância política dos rios,
terminou a aula com essa afirmação que, segundo ele, provava o seu
ponto: “E o grito de independência de dom Pedro aconteceu às
margens do rio Ipiranga”. É. Se o riachinho Ipiranga não
existisse, dom Pedro não teria gritado “Independência ou morte!”
e nós ainda seríamos colônia de Portugal. (Mas será que foi isso
mesmo que ele gritou? Por vezes, os gritos reais dos heróis são
impublicáveis...) Por razões que não conheço, o dito professor
resolveu candidatar-se a vereador, no Rio de Janeiro, certamente
convencido de que tinha uma grande contribuição política a
oferecer à cidade. Ou pode ser que ele mesmo tenha sentido o tédio
dos seus ditados. Melhor ser vereador. Ganhar dinheiro sem fazer
força, sem ditados, sem corrigir provas. Muitas decisões políticas
se fazem por razões não políticas. Ele parava de ditar e falava
sobre sua vitória certa. “Tenho sido professor por vinte anos. Por
minhas mãos passaram 2500 alunos.” (Inventei esse número. O
número real eu esqueci.) Esses alunos se casaram. 2500 se
transformam em 5000: maridos e esposas. Esses 5000 têm parentes e
amigos... Ao final de suas contas ele seria eleito com mais de 50.000
votos…
Rubem
Alves, in Ostra feliz não faz pérola
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