Não
vou dizer que senti simpatia por aquele bicho, logo que ele se postou
à minha frente. Pelo contrário. Meu primeiro gesto foi para
exterminá-lo, mas o bicho deu uma corrida tão a propósito que a
mão bateu em cheio na mesa, e só amassou a fatia de bolo no prato.
Minutos
depois, ele voltou para o mesmo lugar, e desisti de matá-lo. Ficava
junto ao bolo amassado, e não parecia com intenção de comer.
Estava ali por estar, simplesmente. Imóvel.
Comecei
a olhá-lo com interesse e finalmente com ternura. O bicho não
queria nada. Saí, voltei, continuava no mesmo ponto escolhido. Eu
disse escolhido? Certamente elegera aquele lugar para residência, e
preferia não ser incomodado.
Dei
ordem para que não o incomodassem. Passei a chamá-lo “o corvo”,
embora não tivesse nada de corvo. Era um animal insignificante,
enrugado, inofensivo. Meu filho alvitrou que talvez se tratasse de
uma ideia fixa. Mas se movimentara tão rápido, no primeiro dia, que
a noção de fixidez não era aplicável. Sei não, mas eu gosto
daquele animalzinho.
Carlos
Drummond de Andrade, in Contos plausíveis
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