O
ministério não vacilou em aceitar o fim voluntário de minha
carreira.
Meu
suicídio diplomático proporcionou-me a maior alegria: a de poder
regressar ao Chile. Acho que o homem deve viver em sua pátria e
creio que o desarraigamento dos seres humanos é uma frustração que
de uma maneira ou de outra entorpece a claridade da alma. Eu não
posso viver senão em minha própria terra. Não posso viver sem pôr
os pés, as mãos e o ouvido nela, sem sentir a circulação de suas
águas e de suas sombras, sem sentir como minhas raízes buscam em
seu barro pegajoso as substâncias maternas.
Mas
antes de chegar ao Chile fiz outro descobrimento que agregaria uma
nova camada ao desenvolvimento de minha poesia.
Detive-me
no Peru e subi até as ruínas de Machu Picchu. Subimos a cavalo. Na
época não havia estrada. Do alto vi as antigas construções de
pedra rodeadas pelos altíssimos cumes dos Andes verdes. Da cidadela
carcomida e roída pelo passar dos séculos despenhavamse torrentes.
Massas de neblina branca levantavam-se do rio Wilcamayo. Senti-me
infinitamente pequeno no centro daquele umbigo de pedra, umbigo de um
mundo desabitado, orgulhoso e eminente, ao qual de algum modo eu
pertencia. Senti que minhas próprias mãos tinham trabalhado ali em
alguma etapa distante, cavando sulcos, alisando penhascos.
Senti-me
chileno, peruano, americano. Tinha encontrado naquelas alturas
difíceis, entre aquelas ruínas gloriosas e dispersas, uma profissão
de fé para a continuação de meu canto.
Ali
nasceu meu poema “Alturas de Machu Picchu”.
Pablo
Neruda, in Confesso que vivi
Nenhum comentário:
Postar um comentário