Poesia
a minha velha amiga...
eu
entrego-lhe tudo
a
que os outros não dão importância nenhuma...
a
saber:
o
silêncio dos velhos corredores
uma
esquina
uma
lua
(porque
há muitas, muitas luas...)
O
primeiro olhar daquela primeira namorada
que
ainda ilumina, ó alma como
uma
tênue luz de lamparina,
a
tua câmara de horrores.
E
os grilos?
Não
estão ouvindo, lá fora, os grilos?
Sim,
os grilos...
Os
grilos são os poetas mortos.
Entrego-lhe
grilos aos milhões um lápis verde um retrato
amarelecido
um velho ovo de costura os teus pecados
as
reivindicações as explicações — menos
o
dar de ombros e os risos contidos
mas
todas
as lágrimas que o orgulho estancou na fonte
as
explosões de cólera
o
ranger de dentes
as
alegrias agudas até o grito
a
dança dos ossos...
Pois
bem
às
vezes
de
tudo quanto lhe entrego,
a
Poesia faz uma coisa que parece que nada
tem
a ver com os ingredientes mas que tem por isso mesmo um sabor total:
eternamente
esse gosto de nunca e de sempre.
Mário
Quintana
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