1
— Inclusive
o monstro do Lago Ness.
— Ness?
Pior:
tudo pode acontecer dentro do mesmo parágrafo, reclamava me
sacudindo pelo colarinho, como se eu, logo eu!, pudesse
fazer alguma coisa e impedir aquela história monstruosa de existir,
avançar, recuar, rodopiar, corromper.
Um
dia, tinha que ser, a pergunta saiu naturalmente:
— Que
tal aplicar o esquema de funções a essa coisa? Talvez tenha cura.
Deus é grande, professor.
Uma
semana me olhando a zero graus centígrados.
2
— Quais
vão ser os convidados?, fiquei pensando na cama, antes de levantar,
o cigarro apagado numa mão.
Imaginei
uma festa que eu mesmo desse, uma festa, por exemplo, para
comemorar o meu fim, digamos. Diria a cada amigo, colega ou
conhecido:
— Olha,
amanhã vou me matar, e gostaria antes de celebrar com alguns amigos.
Só o pessoal mais chegado. Uns trezentos, trezentos e cinquenta.
3
Façam
as listas, senhores, faites vos jeux, faites vos jeux, quem você
convidaria? Deste lado, os entes imaginários mais queridos, mamãe,
papai, o professor Propp, tia Verônica, a doutora Margaret, a
namorada do Marcelo, as irmãs Consuelo, o filho do seu Djalma, o
Eusébio e a Sheila e toda a família do Mário. Isso sem falar nos
Tavares de Lima, nos Cabral de Mello, nos Cavalcanti Proença, os da
Silva Ramos, os Pereira Carneiro, os Leitão da Cunha, os Loyola
Brandão, isso sem falar naqueles outros lá, que estão olhando, com
uma cara pedincha, esperando entrar na lista a qualquer momento.
Deste
lado, as pessoas de carne e osso: King-Kong, Bruce Lee, Greta Garbo,
O Homem Que Ri, O Velho E O Mar, Jesse James, Erik Leif o Vermelho,
Madame Bovary, Hugh Selwyn Mauberley, Moby Dick, El Cid, Kublai Kã,
Corisco, Rett Butler, Gregory Peck, Rrose Sélavy, a hipótese,
Drácula, a medusa, D. Sebastião, o quadrado da hipotenusa, a
felicidade universal, things like that. Todo mundo, menos
Nostradamus, por favor.
E
quanto a você? Que tal, convidaria a si mesmo?
Sem
você, não vai ter a menor graça. E, não tem dúvida, vai ser uma
festa e tanto.
4
Prezado
Herr Doktor Professor,
eu
só queria saber
por
que nessa história
todo
mundo tem nome, menos eu
atenciosamente,
menos
eu.
Paulo
Leminski, in Agora é que são elas
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