A
lembrança do orangotango Rango é outra imagem tema, que vem das
ondas. Em Medán, Sumatra, bati algumas vezes na porta do arruinado
jardim botânico. Para meu assombro, era ele quem vinha sempre abrir.
De mãos dadas, percorríamos um caminho até sentar-nos numa mesa
que ele golpeava com as mãos e os pés. Aparecia então um criado
que servia uma jarra de cerveja, nem pequena nem grande, boa para o
orangotango e para o poeta.
No
zoológico de Cingapura víamos o pássaro-lira dentro de uma jaula,
fosforescente e colérico, esplêndido em sua beleza de ave
recém-saída do éden. E mais além passeava em sua jaula uma
pantera negra ainda cheirando à selva de onde veio. Era um fragmento
curioso da noite estrelada, uma faixa magnética que se agitava sem
cessar, um vulcão negro e elástico que queria arrasar o mundo, um
dínamo de força pura que ondulava; e dois olhos amarelos, certeiros
como punhais, que interrogavam com seu fogo, que não compreendiam
nem a prisão nem o gênero humano.
Pablo
Neruda, in Confesso que vivi
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