Não
aguento mais ouvir de uma voz feminina com amargura e rancor que não
quer mais casar. Seguidoras de Paulo Mendes Campos acreditam que, se
o amor acaba, pra que começar outro?
São
aquelas que se casaram de branco no dia mais feliz de suas vidas,
apaixonadas e entregues, e que depois enfrentaram a ira de um
ciumento, as neuras de um obcecado, as fraquezas de um viciado, se
envolveram com famílias alheias intolerantes, conheceram a frigidez
na rotina, a traição injusta seguida por mentiras incabíveis, e
decidiram pôr um fim no sonho de eternizar aquele instante em que
tudo parecia fazer sentido, em que os pombinhos nasceram um para o
outro e morreriam grudados num fio eletrocutado ou numa praça
poluída, na alegria e na desgraça.
Para
aquelas que já passaram por um ou dois casamentos e tropeçaram no
degrau da separação, em que a decepção trocou de lugar com o
amor, e o futuro virou poeira, não aguento mais replicar:
“Se
o amor nos enlouquece, imagine a loucura que é ficar sem ele.”
Para
aquelas que dizem não acreditar mais no amor, proponho então
experimentar outros amores e apostar nesse bilhete só de ida.
Uma
noite de prazer acaba.
Um
banquete acaba.
Uma
viagem inesquecível acaba.
O
fim de semana na ilha paradisíaca, um campeonato, o dia, o ano, o
gozo, um livro, um disco, um banho de banheira e uma nhá benta
acabam.
Como
Sísifo, não por isso evitamos outros.
Os
homens?
Vou
lhes dizer: amamos tanto as que nos deram à luz, nos deram intuição,
formas alternativas de pensar, mostraram detalhes que passavam
despercebidos, exigiram atenção, dedicação, carinho, nos fizeram
ser românticos, vencer a vergonha, e nos inspiraram músicas,
poesias, até guerras, e nos ensinaram os diversos tipos de
chocolate…
Se
vocês não acreditam mais, quem acreditará? Lembrem-se de
Nietzsche, que nos últimos dias numa vila italiana, com o calor na
pele, viu alegria no niilismo e esperança no desamparo: “Cada
passo mínimo dado no campo do pensamento livre, da vida moldada no
seu formato pessoal, foi desde sempre conquistado com martírios
espirituais ou corporais.”
Trégua.
Que
venham os clichês. Cá está o ombro para o choro da mudança de
humor inexplicável e inesperada. Quer que eu apague a luz na
enxaqueca? Explico com toda a paciência a regra do impedimento, quem
joga contra quem, e o que significa aquele quadro no alto da tela, em
que três letras, COR, vencem por 2 X 1 as três letras PAL.
Fique
na cama na TPM. Trarei uma bolsa de água quente e o jantar. Sim,
vamos comprar sapatos. Eu espero. Levo um livro, enquanto você
experimenta a loja.
Adorei
a cor do esmalte, o corte do cabelo. Batom vermelho te deixa mais
bonita. Não, a calcinha não está marcando. Ah, põe o tubinho
preto, se bem que gosto quando você coloca aquele vestidinho
colorido. Não, o sutiã não está aparecendo.
Eu
ligo para o despachante, faço um rodízio nos pneus, troco a
bateria, reconfiguro seu computador, mando lavar o tapete, o forro do
sofá, também adoro ele com almofadas indianas em cima.
Cuido
de você na velhice, não te trocarei por uma adolescente que cheira
a tutti frutti, nem pela secretária vulgar da firma, amarei a
sua pele um pouco mais flácida, seus seios naturalmente instáveis,
seu corpo maduro, seus joelhos frágeis. E tomaremos vinho tinto
todas as noites. Prefere branco? Que celulite?
Porém
a maioria de vocês conhece agora as teclas de atalho, a pressão nos
pneus, sabe chamar o seguro para uma pane elétrica, e que carrinho
por trás dá cartão vermelho. Tornaram-se independentes.
Pesquisa
da Serasa Experian mostrou que as mulheres são a maioria entre os
mais ricos do país — segundo o estudo, cerca de 4,9 milhões de
mulheres e 4,7 milhões de homens participam do grupo dos mais
prósperos do Brasil, as classes A e B, e que as mulheres “ricas”
somam cerca de um milhão, e 611 mil mulheres são executivas
bem-sucedidas.
E
nós. Último censo do IBGE: o número de divórcios triplicou,
enquanto o de casamentos formais de papel passado caiu 12%.
O
amor se tornou líquido, não é, Zygmunt Bauman? “Se hoje vivemos
em redes virtuais, que aproximam e afastam as pessoas, somos capazes
de manter laços fortes e relações verticais?”, pergunta.
Entendi,
deixamos de preservar o passado e começamos a viver um presente
perpétuo, a era do hedonismo e do consumo desenfreado, vazio difícil
de saciar.
Desistimos
da sede pelo amor?
Não,
as mulheres não são o apêndice do homem, mas a fonte original da
vida e a nossa razão de ser. Não nos deixem desamparados. E
aprendam com as nossas fraquezas e com todos os erros.
Amar
ainda é a única maneira de convivermos com a sua delicadeza e de
alimentarmos nossa vocação de proteger e cuidar. Não façam do
homem uma noite sem vento, um mundo sem gravidade. Parecemos tolos e
infantis, controladores e insensíveis. Mas nós as amamos tanto…
Acaba
mesmo?
Comece
outro.
Antes
que a amargura substitua o brilho dos seus olhos.
E
a pieguice, a rima e as metáforas sejam extintas.
Marcelo
Rubens Paiva, in As verdades que ela não diz
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