Assim que ele deu
de cara com as setecentas lâminas da máquina da morte doidinhas pra
torá-lo ao meio, as setecentas lâminas que ele mesmo tinha
instalado, todas setecentas, Antônio deu um pulo pra cima, respeite
o pulo de Antônio, e foi vento que as lâminas toraram somente.
E no que seus dois
pés pisaram o chão novamente e o povo viu que ele estava ali, dos
pés à cabeça, todo inteiro, foi aí que começou a vaia.
Repare mesmo que
azar o de Antônio. O instante em que ele saiu colou com o instante
em que ele chegou, sem nem uma brecha no meio. Quem olhava pra ele
pensou que ele tinha estado o tempo todo ali, mas é claro, e o mundo
inteiro duvidou que Antônio tinha ido ao futuro mesmo. Uns achavam
até graça, pensando que era piada, outros tinham era raiva,
pensando, que desaforo.
Pela primeira vez
na história ninguém ganhou aposta, nem um lado, nem o outro, e por
fim ficou tudo empatado. Perdeu quem apostou que Antônio iria ao
futuro, perdeu também quem apostou na morte dele.
O que se comentava
pelo mundo era que Antônio farrapou, “que sujeito mais sem palavra
que não foi a futuro algum nem morreu morte nenhuma, tudo que fez
foi dar um pulo pra cima, atração muito da besta inclusive, coisa
que qualquer um teria feito com a maior facilidade”.
Em defesa própria,
Antônio sustentou que foi ao futuro de fato, mas se atrapalhou um
pouco no caminho da volta: por isso regressou no mesmo instante em
que tinha partido, por pura infelicidade, e esse era o motivo dessa
confusão toda.
Contou ainda o que
tinha visto lá, na frente, em dois mil e pouco, dali a 25 anos, seis
meses e 17 dias mais precisamente.
— Quem já viu
disso, menino?
— Ainda mais num
lugar sem futuro desses.
— Agora ficou
doido de vez.
— Deixe de
conversa.
— Mas esse
Antônio já inventa.
“Fui, não foi,
fui sim, não estou dizendo?”
O que ele dizia não
valia era mais nada.
O mundo inteiro
desprezou cada palavra de Antônio, que tristeza, o mundo inteiro se
pôs a rir de Antônio, o mundo inteiro, menos Karina, obviamente.
Adriana Falcão,
in A máquina
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