Meu amigo Baiano me
pede que eu declare seu nome de batismo. Isso porque, segundo o
Baiano, a rapaziada da terra dele não acredita que a gente bebe
junto no Bar da Maria.
- ‘Xá-de-sê
mintiroso, seu minino. Tu bebe cum Valdimir Branquis nada, ô xente!
Tá legal, Baiano.
Alô, Nordeste! Atenção, Agreste, Sertão, Cerrado, Caatinga,
Coqueirais e Mandacurus! O nome do Baiano é Wilson Flora! E, só pra
não perder a viagem Valdimir Branquis é o cacete!
Tudo isso é pra
dizer que Baiano inventou uma explicação muito original sobre os
motivos que podem levar um senador a mandar matar um sargento
comilão, sujeitando a digníssima esposa a um vexame nacional. É
claro que tudo não passa de especulação e qualquer semelhança com
vivos e mortos do Brasil de hoje é mera coincidência.
- Cê vê, Blanc:
se o cara tivesse ficado boneco e não chiasse, ou se tivesse dado
apenas ligeira aparadinha nos chifres, umas bolachas e coisa e tal, o
negoço não extrapolava. Ora, pra virar suruba nacional, só tem uma
explicação plausível...
Bom contador de
história, Baiano acende uma cigarrilha e assume um arzinho altivo,
coisa de Sherlock Holmes caboclo.
- Homem acostumado
ao poder, o marido pirou por motivos concernentes à etiqueta e não
necessariamente afeitos à esfera sexual!
Tem horas que o
Baiano enche o saco, né?
- Pegou o espírito
da coisa, Blanc?
- Ainda não.
- Pois eu vou
reconstituir o crime pra você entender a jogada.
- Obrigado, Wilson.
- Disponha. Me
acompanhe: o senador chega em casa mais cedo e grita: Queriiidaaa!
- Hum-hum.
- Que resposta
obtém? Nenhuma. Do quarto chega uns gemidozinhos abafados, ai, ui,
tira, bota, esses fundamentos. Que faz o senador?
- Puxa a parabélum.
- Nãozinho.
- Trinca a peixeira
e parte pra cima.
-Never! Homem
habituado aos meandros do poder, o senador fica frio e vai investigar
a questão. Entra no quarto e dá de cara com o sargento, ou patente
próxima, mais atochado na senhora dele que camarão em vatapá. Que
atitude toma o senador?
- Sei lá, pô.
Explode o cômodo.
- Nunca, jamais, em
tempo algum. íntimo dos acidentes do poder, o senador delibera,
tenta o debate, o que eles mesmo chamam de um “amplo entendimento”.
Diz pro rapaz: “Mas logo você, que não tinha onde cair morto e a
quem tanto ajudei?” E virando o foco pra cara-metade: “Será
possível o que meus olhos veem?”
- Ah, Baiano,
qualé?
- E o casal? Que
reação tem o casal, diante desse exemplo de moderação?
- Bom,
envergonhados, os dois se cobrem e...
- Errou de novo. O
casal continua no vapt-vupt. Aí, sim, o senador, sentindo-se
agredido na investidura do seu poder, perde as estribeiras. Porque um
dos lemas do poder é: querem prevaricar, prevariquem, mas com muito
respeito.
Aldir Blanc,
in Brasil passado a sujo
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