sábado, 19 de maio de 2018

Do desprendimento da bondade

Quando a bondade se mostra abertamente já não é bondade, embora possa ainda ser útil como caridade organizada ou como ato de solidariedade. Daí: “Não dês as tuas esmolas diante dos homens, para seres visto por eles”. A bondade só pode existir quando não é percebida, nem mesmo por aquele que a faz; quem quer que se veja a si mesmo no ato de fazer uma boa obra deixa de ser bom; será, no máximo, um membro útil da sociedade ou zeloso membro de uma igreja. Daí: “Que a tua mão esquerda não saiba o que faz a tua mão direita.”
(...) O amor à sabedoria e o amor à bondade, que se resolvem nas atividades de filosofar e de praticar boas ações, têm em comum o fato de que cessam imediatamente - cancelam-se, por assim dizer - sempre que se presume que o homem pode ser sábio ou ser bom. Sempre houve tentativas de dar vida ao que jamais pode sobreviver ao momento fugaz do próprio ato, e todas elas levaram ao absurdo.
Hannah Arendt, in A condição humana

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