Uma
das fórmulas aconselhadas para abreviar as visitas intermináveis é
colocar a vassoura atrás da porta. Com a palha para cima e o cabo
para baixo, ao inverso da posição em que é usada.
As
informações vêm de todo o Brasil, porque ninguém ignora essa
curiosa técnica com que os importunos são despedidos, ou obrigados
a sair por uma força de impulsão mágica e livrar as vítimas de
uma presença monótona e sonolenta.
Naturalmente
os indígenas e os escravos africanos não conheceriam esse processo
aliviador dos amigos insensíveis ao valor do tempo e menos ainda
atendendo ao trabalho dos pacientes visitados.
Tivemos
a vassoura de Portugal e com ela o complexo supersticioso ainda
mantido. Expedir as visitas de permanência indefinida é uma dessas
funções simbólicas. Não há quem desconheça essa aplicação da
vassoura em qualquer recanto do Brasil.
Negros
e amerabas varriam suas moradas, mas não sabemos se possuíam
crendices decorrentes. No Brasil houve, ou ainda há no interior do
Maranhão, uma Nossa Senhora da Vassoura.
Em
Portugal verifica-se o mesmo hábito e de lá recebemos a crença em
que muita gente acredita, além e aquém Atlântico.
Quando
alguém encontrar uma vassoura atrás da porta, convença-se de estar
presenciando um ato supersticioso com mais de vinte séculos de
existência. J. A. Hild, estudando o deus Silvanus, e M. L. Barré,
analisando as lucernas de Pompeia, permitiram que tomasse faro e rumo
para a identificação do costume, através da quarta dimensão.
Identificar a origem.
Silvanus,
divindade campestre na campanha de Roma, confundia-se com Faunus,
para introduzir-se nas moradas campesinas e praticar pequenos e
grandes malefícios e diabruras desagradáveis, como o nosso
Saci-Pererê. Para afastar Silvanus, informa Santo Agostinho, três
deuses rurais socorriam a família ameaçada. Cada uma dessas
entidades compareceria conduzindo um atributo de sua função
profissional. Bastaria o dono da casa dispor em lugar bem visível os
três objetos representativos dos três deuses, para Silvanus fugir e
não voltar, tentando as proezas malandras. Esses objetos eram um
machado, uma mão de pilão e uma vassoura. Como Silvanus vivia a
vida selvagem, primitiva e rústica, déteste ces outils hostiles
à son empire. Pilão, machado e vassoura são utensílios
denunciadores de uma organização social regular, normal e acima dos
costumes errantes de Silvanus. Era obrigado a deixar esse clima, bem
acima e irrespirável para suas narinas de bosque umbroso e roçaria
deserta. Restava-lhe apenas a fuga, afirma Hild. M. L. Barré,
citando esse Silvanus doméstico, autor de visões noturnas,
aterrador de crianças, “et l’on croyait paralyser l’influence
funeste de cette divinité en mettant un balai en travers de la porte
de la maison”. Paul Sébillot registra a vassoura atrás da
porta, atravessada e sempre invertida, espavorindo as bruxas na
Baviera, Hesse, França etc. Essas bruxas tinham, coitadas, recebido
a herança romana de Silvanus.
Hild
e Barré morreram, sem saber da existência dessa vassoura
supersticiosa no Brasil contemporâneo.
Mas
a origem, até prova expressa e convincente em contrário, é essa
que tomei a liberdade de expor...
Luís
da Câmara Cascudo, in Coisas que o povo conta
Nenhum comentário:
Postar um comentário