No
palco uma mesa posta para 13 pessoas. Copos, pratos e talheres
rústicos, grossas velas toscas e na frente de cada lugar um
cartãozinho com o nome de quem deve sentar ali. Ninguém no palco.
Da
esquerda aparece um mordomo seguido de um casal elegantemente
vestido. O casal entra em cena visivelmente inseguro, olhando para
todos os lados. O mordomo anuncia que os outros não demorarão a
chegar e diz para o casal ficar à vontade. Se quiserem, podem beber
água da moringa. O mordomo sai de cena. O casal se entreolha.
Ela
diz, num cochicho:
— Onde
nós estamos?
Ele,
cochichando também:
— E
eu sei?
— Olhe
o convite de novo.
O
homem tira o convite do bolso do smoking e o examina pela décima
vez. O convite ainda diz a mesma coisa.
— Só
a data, a hora, o endereço e, embaixo, “RSVP”.
— Esse
“RSVP” é que é a chave de tudo. Deve ser as iniciais de alguma
coisa.
— Mas
do quê?
—
“Reunião dos...” Sei lá.
—
Podemos estar no jantar errado.
— Mas
o mordomo viu o convite e nos deixou entrar.
— Olhe
os cartõezinhos para ver se os nossos nomes estão aí.
Ela
(lendo):
—
“João”, “Tiago”, “Pedro”...
Ele
(lendo):
—
“Mateus”, “Simão”, “Judas”...
— Viu?
Nossos nomes não estão aqui. Estamos no lugar errado.
—
“Jesus”!
— Que
foi?
— Neste
cartãozinho. Está escrito “Jesus”!
Lentamente,
eles se dão conta do que isto significa. Fazem a volta na mesa, um
para cada lado, lendo os cartõezinhos outra vez. Se reencontram no
meio da mesa.
— Aí
está — diz ele. — Jesus ao lado de Pedro.
Os
dois se encaram, de olhos arregalados e boca aberta. Finalmente ele
consegue falar.
— As
letras...
— Que
letras?
— Na
cruz. Em cima da cabeça de Jesus Cristo. Não eram...
— RSVP!
Ele
toma uma decisão:
— Vamos
embora.
—
Espera. E se a gente ficasse para...
— Está
maluca? Isto aqui acaba mal. Não vamos nos meter nesta confusão.
—
Mas...
— Olhe,
o jantar vai ser horrível, acredite. Só pão ázimo, vinho barato e
conversa de homem. Você seria a única mulher. Iria se sentir
deslocada.
— Sim,
mas...
— E
eles obviamente não estão nos esperando. Pense no vexame.
A
mulher se convence. Tudo, menos uma gafe social. Os dois saem
furtivamente do palco.
Luís
Fernando Veríssimo, in Diálogos impossíveis
Nenhum comentário:
Postar um comentário