quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Os diabinhos de Ocumicho


Como as arpilleras chilenas, nascem de mão de mulher os diabinhos de barro da aldeia mexicana de Ocumicho. Os diabinhos fazem amor, a dois ou em bando, e assim vão à escola, pilotam motos e aviões, entram de penetras na arca de Noé, se escondem entre os raios do sol amante da lua e se metem, disfarçando-se de recém-nascidos, nos presépios de Natal. Insinuam-se os diabinhos debaixo da mesa da Última Ceia, enquanto Jesus Cristo, cravado na cruz, come peixes do lago de Pátzcuaro junto a seus apóstolos índios. Comendo, Jesus Cristo ri de uma orelha a outra, como se tivesse descoberto que este mundo pode ser redimido pelo prazer mais que pela dor.
Em casas sombrias, sem janelas, as alfaieiras de Ocumicho modelam estas figuras luminosas. Fazem uma arte livre as mulheres atadas a filhos incessantes, prisioneiras de maridos que se embebedam e as golpeiam. Condenadas à submissão, destinadas à tristeza, elas acreditam cada dia numa nova rebelião, uma alegria nova.
Eduardo Galeano, in Mulheres

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